Manchetes Socioambientais
As notícias mais relevantes para você formar sua opinião sobre a pauta socioambiental
O trabalho do ISA no monitoramento de "pressões e ameaças" parte do entendimento de que "pressão" é um processo de degradação ambiental (desmatamento, roubo de madeireira, garimpos, incêndios florestais etc) que ocorre no interior de uma área legalmente protegida, como Terra Indígena, Território Quilombola e Unidade de Conservação, como Parques e Florestas Nacionais, levando a perdas de ativos e serviços socioambientais. Ou seja, "pressão" é um processo que pode levar à desestabilização legal e ambiental de determinada área protegida. Já "ameaça", por sua vez, é a existência de risco iminente de ocorrer alguma degradação ambiental no interior de uma área protegida.
Tomadas cumulativamente, as pressões e ameaças podem gerar impactos socioambientais negativos de magnitude e alcance suficientes para desencadear o colapso no funcionamento dos ecossistemas e dos modos de vida das populações locais - e impactos negativos nas cidades. Os povos indígenas e populações tradicionais, como comunidades quilombolas e ribeirinhas, são diretamente atingidos pelas pressões e ameaças por terem seus territórios invadidos, suas florestas desmatadas e seus rios desviados e contaminados.
Aqui no ISA, o trabalho de monitoramento das pressões e ameaças é feito por pesquisadores especializados em antropologia, direito socioambiental, modelagem de uso da terra e avaliação de políticas públicas. A equipe diretamente responsável pelo monitoramento de áreas protegidas do ISA atua na conexão entre pesquisadores, formuladores de políticas públicas e tomadores de decisão. As áreas de atuação desse time abrangem o desenvolvimento de pesquisas científicas e aplicações em sistemas de informação geográfica e ferramentas de monitoramento da situação jurídica, demográfica e projetos governamentais que impactam as áreas protegidas.
O monitoramento de áreas protegidas do ISA possui conhecimento acumulado no monitoramento de pressões e ameaças desde a década de 1980 como um dos primeiros programas da sociedade civil no Brasil a construir uma plataforma organizada de sistemas de informação socioambiental, antes mesmo que setores governamentais. Esse trabalho iniciou-se no antigo Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), em 1983, com o monitoramento de Terras Indígenas no Brasil. Em 1992, ainda no Cedi, foi iniciado o monitoramento das Unidades de Conservação na Amazônia e outras áreas públicas. Seu Sistema de Informação de Áreas Protegidas (SisArp) é um sistema Web com 15 módulos de dados por temas específicos, incluindo o módulo de pressões e ameaças. O SisArp alimenta sites institucionais que disponibilizam dados, mapas, imagens, vídeos, notícias, publicações e análises temáticas. Alguns sites estão listados abaixo, confira!
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Em formato de enciclopédia, é considerado a principal referência sobre o tema no país e no mundo |
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A mais completa fonte de informações sobre o tema no país |
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Versão especial da Enciclopédia PIB para a educação infantil; |
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o primeiro produto web de referência neste tema, lançado em junho de 2007 |
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painel de indicadores de consolidação territorial para as Terras Indígenas |
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painel de informações sobre o estado das florestas e alertas de pressões e ameaças que impactam as áreas protegidas. |
Segundo relatos, invasores a cavalo entraram em duas aldeias na Terra Indígena Apyterewa, instaurando o terror entre os indígenas. Território está entre os mais desmatados da Amazônia
A onda de ataques violentos aos Povos Indígenas no Brasil agora tem como alvo os Parakanã, da Terra Indígena Apyterewa, no Estado do Pará. De acordo com relatos, nesta segunda-feira (16/5) grileiros montados em cavalos invadiram duas aldeias Ka’a’ete e Tekatawa, instaurando o terror e escalando a tensão a um nível inédito.
A Terra Indígena Apyterewa está entre as mais desmatadas da Amazônia e sofre historicamente com a invasão ilegal de suas terras. Grande parte do território está tomado por grileiros, um processo que se intensificou com uma decisão do ministro do STF Gilmar Mendes de aceitar uma eventual conciliação entre o município de São Félix do Xingu e o Povo Parakanã para rever os limites da terra indígena.
Em 2020, Mendes autorizou um processo de conciliação que estimulou ainda mais a grilagem e o desmatamento ao criar uma expectativa de regularização da invasão ilegal. Somente em setembro, o desmatamento no território Parakanã registrou 2.480 hectares. Essa é a maior taxa já detectada na TI na última década. A decisão foi revertida em dezembro de 2021, mas o estrago já estava feito.
Durante a nova onda de invasão, 17 famílias dos Parakanã decidiram abrir duas aldeias no interior do território — Ka’a’ete e Tekatawa— com o intuito de ampliar a área de ocupação indígena e a proteção territorial. As aldeias, porém, estão muito próximas da área de invasão, dentro das fazendas dos grileiros, deixando esses indígenas numa situação de vulnerabilidade extrema.
Desde domingo (15/5), indígenas receberam informações de que os fazendeiros invasores estariam se organizando em grupos para cercar as duas aldeias e invadir a moradia dos indígenas a cavalo. Nesta segunda, eles executaram o plano e entraram nas duas aldeias.
Segundo o MPF, no domingo, o superintendente da Polícia Federal em Belém e o delegado de Redenção, cidade mais próxima ao possível local dos ataques, foram avisados das ameaças. A área é de difícil acesso, por isso, MPF e órgãos de segurança tentam viabilizar medidas prioritárias de segurança para evitar violência contra as aldeias Parakanã.
De acordo com lideranças, indígenas que vivem à beira do Rio Xingu, numa área mais distante das invasões, se preparam para uma expedição às aldeias que estão sob ataques, com o intuito de tentar protegê-los da violência dos invasores.
Histórico de invasões
A TI Apyterewa, morada dos Parakanã, foi homologada em 2007 e está em processo de desintrusão e realocação dos ocupantes não-indígenas desde 2011, uma das condicionantes da licença ambiental para a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. No entanto, o que se viu nos últimos anos foi a intensificação das invasões na TI.
Além da grilagem de terras, a região enfrenta o avanço do garimpo ilegal. Essas duas atividades teriam seu ponto de apoio logístico na Vila Renascer, povoado criado em 2016 no interior da TI e que não para de expandir. Na vila, já funcionam ilicitamente bares, igrejas evangélicas, restaurantes, oficina mecânica, posto de gasolina, mercado, postes de rede elétrica e até um pequeno hotel.
Mesmo com a presença permanente da Força Nacional, a TI Apyterewa continua à mercê de invasões, conflitos e ameaças. O desmatamento já pressiona as Terras Indígenas vizinhas, como a Araweté Igarapé Ipixuna e a Trincheira Bacajá, onde, por meio de ramais abertos ilegalmente, foram iniciadas em 2019 novas frentes de invasão que continuam se expandindo. A expectativa de regularização da terra grilada é um fator importante na atração de invasores e se sustenta nos discursos do Governo, que já se mostrou favorável à redução de territórios indígenas e à regularização de mineração em Áreas Protegidas.
Sempre no topo do ranking do desmatamento entre as TIs, a Apyterewa chegou a representar, sozinha, 52% do desmatamento de todas TIs da bacia no penúltimo bimestre de 2021, atingindo a maior taxa de desmatamento registrado no território nos últimos dez anos. O desmatamento em 2021 na TI Apyterewa aumentou 28% em relação a 2020, é a maior taxa anual (em Terras Indígenas) registrada pelo monitoramento do Sirad X, que se iniciou em janeiro de 2018. Além disso, na TI Apyterewa, foram detectados mais 22 km de novas estradas ilegais no último bimestre do ano passado. Essas estradas viabilizam a grilagem de terra, a exploração garimpeira e as invasões nas Terras Indígenas vizinhas.
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Projeção da FAO, órgão das Nações Unidas para agricultura e alimentação, e posicionamento de indígenas Waimiri Atroari sobre o Linhão de Tucuruí, são os destaques socioambientais desta quinzena
Bomba da Quinzena
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) revelou que o desmatamento no Brasil, para além de todos os impactos socioambientais negativos, gerará também prejuízo financeiro à agricultura. Pelas próximas três décadas, a FAO estima prejuízos de mais de 1 bilhão de dólares por ano no setor, enquanto modelos de preservação da floresta poderiam garantir renda ao país.
O informe da FAO é mais um alerta sobre como o desmatamento no Brasil é significativo e preocupante. Especialmente porque a devastação não é proporcionalmente acompanhada por reflorestamento e tal pressão socioambiental soma-se a outras, como garimpo e grilagem, aumentando ainda mais a destruição da floresta.
De acordo com a entidade, preservar a floresta é importante para economia: a preservação da Amazônia brasileira garantiria uma renda anual de cerca de 800 dólares (quase quatro mil reais) por hectare.
E você com isso?
Comunidades tradicionais, indígenas e pequenos agricultores são centrais para a manutenção das florestas em pé. A FAO cita diversos estudos que mostram que o aumento da produtividade das terras agrícolas e da pecuária, combinado com políticas públicas e de mercado adequadas, podem ajudar a frear o desmatamento.
Para apoiar a recuperação econômica e socioambiental, é necessário: frear o desmatamento; restaurar terras degradadas e expandir a agroflorestação; e utilizar de forma sustentável as florestas. São imprescindíveis mudanças políticas que definam como prioridades de investimento a conservação, a restauração e o uso sustentável, na contramão do atual governo que promove ações que prejudicam as florestas e que fiscaliza menos de 3% dos alertas de desmatamento no país atualmente.
Em 2022, pelo quarto ano consecutivo, o governo de Jair Bolsonaro cortou linhas de crédito para a agricultura familiar, setor responsável por 70% dos alimentos que os brasileiros põem à mesa. Enquanto isso, o preço dos alimentos segue crescendo.
Incentivar e consumir produtos agrícolas de pequenos produtores locais e pressionar o governo em prol da agenda socioambiental são caminhos individuais que têm força no coletivo. Ainda, em ano de eleição, não dá pra deixar de dizer que apoiar candidatos que zelam e priorizam a pauta socioambiental é essencial.
Extra
No último dia 4 de maio, o Senado aprovou um projeto que, na prática, autoriza prévia e indiscriminadamente a implantação de sistemas de transmissão de energia dentro de Terras Indígenas em todo país, desconsiderando impactos específicos em cada território. O Projeto de Lei Complementar 275/2019 viabiliza a medida porque passa a classificar esse tipo de empreendimento como de “relevante interesse público da União”. Agora, a proposta segue para a Câmara.
O projeto restringe as formas de consulta e diálogo com as comunidades indígenas. De acordo com a Constituição, antes da aprovação do projeto, o Senado deveria ter ouvido essas populações.
O povo indígena Waimiri Atroari avisou que não aceitará alterações nos compromissos firmados com a Transnorte Energia S.A, responsável pela construção da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista, o Linhão do Tucuruí, que vai atravessar a Terra Indígena Waimiri Atroari (RR-AM). O Linhão deve aumentar o desmatamento e a circulação de pessoas não-indígenas no território, com impactos sobre fontes de alimentação e matérias-primas, a segurança e o modo de vida tradicional das comunidades.
Baú socioambiental
Mês passado, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou um novo relatório que junta as informações de 2021 sobre conflitos no campo.
Os pontos de destaque do ano foram o aumento no número de assassinatos, mortes em consequência de conflitos, massacre e trabalho escravo: 418 novos territórios entraram na lista de atingidos por esses conflitos. O número de assassinatos aumentou em 75% e o de mortes em decorrência de conflitos aumentou 1.100%.
Dia 25 de Maio é o dia das trabalhadoras e trabalhadores rurais, então, no Baú Socioambiental dessa edição recomendamos o filme-denúncia Armas não atiram Rosas, produzido conjuntamente entre o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) , a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Rede Social de Justiça e Direitos Humanos. O filme é uma denúncia contra a impunidade dos crimes cometidos pelo latifúndio e uma mostra da força do povo, que mesmo ameaçado, mesmo perdendo entes e companheiros queridos, segue lutando por justiça e liberdade.
Isso vale um mapa
Você sabe o que é o Mapa dos Conflitos?
Essa inédita plataforma lançada pela Agência Pública e pela CPT faz parte do especial “Amazônia sem lei”, que investiga a violência relacionada à regularização fundiária, à demarcação de terras e à reforma agrária na Amazônia Legal e no Cerrado.
A plataforma organiza territorialmente conflitos no campo na Amazônia Legal Brasileira relacionados a temáticas como desmatamento, queimadas, mineração, água, agrotóxicos, violência e desigualdade. Com um mapa interativo e dados coletados desde 2011, a ferramenta mostra, por exemplo, que os conflitos na Amazônia afetaram cerca de 100 mil famílias e deixaram mais de duas mil vítimas nos últimos dez anos.
Além disso, o site também conta com a animação “Os conflitos de terras em 5 minutos”, narrada por Itamar Vieira Júnior, ganhador do Jabuti de 2020 com o livro Torto Arado.
Socioambiental se escreve junto
A plataforma Narrativas Indígenas do Nordeste reúne e divulga mais de 200 produções audiovisuais feitas por indígenas do Nordeste. O site é resultado de uma parceria entre a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e indígenas das etnias Xukuru de Ororubá, de Pernambuco, e Tinguí-Botó, de Alagoas. O projeto dá visibilidade às causas indígenas, às lutas sociais, e às suas práticas culturais como canto, dança e religiosidade.
"O audiovisual é uma ferramenta poderosa para poder mostrar a denúncia, mas também a arte de maneira geral”, descreve Marcelo Tingui, cineasta indígena alagoano e integrante da coordenação da plataforma.
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Alerta em Abrolhos, mapa do recorde de desmatamento na Amazônia e a participação inédita do rap indígena no Rock in Rio 2022 são outros destaques da quinzena
Bomba da quinzena
Ao longo do ano de 2021, o governo de Jair Bolsonaro investiu menos em políticas públicas para o fortalecimento das populações indígenas e quilombolas, e reduziu o orçamento para a promoção da igualdade racial, segundo dados do Balanço do Orçamento Geral da União 2021 realizado pelo Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).
De acordo com o estudo, o governo vetou cerca de 860 mil reais que seriam investidos na proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas e cerca de 770 mil que seriam destinados à proteção e demarcação de Terras Indígenas.
O dinheiro executado pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que deveria garantir a proteção territorial e fazer avançar a demarcação de terras, foi utilizado para beneficiar os invasores dessas terras.
Nos últimos 3 anos, 45% dos recursos gastos na ação orçamentária dedicada a proteger e demarcar os territórios indígenas foram destinados a indenizações e aquisições de imóveis – medida que beneficia ocupantes não indígenas.
Sobre os dados relativos ao orçamento destinado aos povos quilombolas, em 2021, foram autorizados apenas R$ 340 mil para o reconhecimento e indenização de territórios quilombolas, dos quais foram pagos apenas R$ 164 mil.
Com relação à Promoção da Igualdade Racial, o recurso gasto foi cerca de oito vezes menor em relação a 2019. O valor autorizado para 2021 foi de R$ 3 milhões, mas apenas 66% do valor destinado foi utilizado para ações de enfrentamento ao racismo. Em 2020, nenhum recurso foi autorizado para a área.
Contraponto
Na contramão desse desmonte, o ex-presidente Lula compareceu ao 18º Acampamento Terra Livre, em Brasília, e prometeu, caso se eleja em 2022, um ministério Indígena e a revogação de portarias e decretos danosos aos povos originários.
Além disso, Lula também convidou indígenas para participar da elaboração de seu plano de governo e disse que em um possível governo irá garantir a consulta prévia aos povos indígenas sobre políticas e medidas que os afetem.
“Queremos participar da construção do projeto de um novo Brasil. Por isso decidimos lançar uma bancada indígena que vai destituir de vez a bancada ruralista. Para que não haja mais Belo Monte no seu governo, para que não haja Belo Sun, hidrelétricas. São nossos territórios. Não podemos mais ficar à margem da construção e da condução desse país”, afirmou a líder indígena Sônia Guajajara, em interlocução com Lula, durante uma das plenárias no ATL.
Participantes do acampamento também exigiram ao ex-presidente a retomada das demarcações e lembraram que a gestão bolsonarista não oficializou sequer uma Terra Indígena. Lula assegurou que irá incorporar ao seu plano de governo a carta com reivindicações entregue a ele na plenária durante o ATL.
Extra
Às vésperas do leilão de blocos para exploração de petróleo e gás da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), foi confirmada pelo Ibama a anulação da portaria que definia a zona de amortecimento do Parque Nacional de Abrolhos, o maior santuário marinho do país. A liberação da área atendeu a uma determinação judicial. Na prática, o entorno de Abrolhos passa a ficar mais vulnerável a empreendimentos.
Segundo especialistas, um possível vazamento de petróleo a cerca de 200 km ao norte ou 100 km ao sul do Parque de Abrolhos poderia chegar ao Parque de Abrolhos em cerca de quatro ou cinco dias.
Um dos objetivos da zona de amortecimento era evitar a exploração de petróleo e gás e outras atividades com possíveis danos ambientais em uma área próxima ao Parque de Abrolhos.
Isso vale um mapa
2022 já é um ano de recordes quando o assunto é desmatamento na Amazônia. O estado do Amazonas, considerado a nova fronteira do desmatamento, teve nos três primeiros meses do ano, os maiores índices de alertas desde 2016.
Em janeiro, o Amazonas registrou 4.400 hectares de áreas sob alerta, em fevereiro houve novas derrubadas, com uma área equivalente a 4 mil campos de futebol. Confirmando o crescimento, em março, a área desmatada foi ainda maior: foram 10 mil hectares de desmatamento, número 72% maior que no ano de 2021.
O impacto do desmatamento é tão grande, que a área perdida no último mês na Amazônia Legal corresponde a todo o território da cidade de Fortaleza e trouxe como resultado um dos piores números da série do INPE. Em comparação com o primeiro trimestre do ano passado, 2022 já apresentou um aumento de 65% no desmatamento.
Baú Socioambiental: 48 anos da 1ª Assembleia Indígena
Neste Abril Indígena relembramos a história da primeira Assembleia Indígena, que aconteceu em 1974, em plena Ditadura Militar.
Foi em Diamantino (MT) onde 20 manifestantes indígenas se reuniram, iniciando uma onda de luta pela demarcação de territórios nacionais, proteção da terra e dos rios. De acordo com relatos do 5º Boletim do CIMI (1976), o objetivo da assembleia era o protagonismo indigena, superando o paternalismo de missões e da Funai.
Apesar das dificuldades e fragilidades de uma organização indígena de abrangência nacional, foi um passo importante na consolidação das lutas dos povos indígenas por seus direitos. Se lançavam as sementes de um novo movimento indígena no país. Nos dez anos seguintes, foram mais de 50 assembleias indígenas em todo o país.
Socioambiental se escreve junto
Vai ter rap indígena no palco do Rock in Rio 2022!!
No dia do festival dedicado ao rap, o grupo Brô MCs foi a atração confirmada para fazer um show com o rapper Xamã, levando pela primeira vez ao palco do Rock in Rio rimas que misturam o guarani, o portugês, o cotidiano e a resistência indígena.
Completando 13 anos de caminhada, os Brô MCs são o primeiro grupo de rap indigena do país, formado por quatro jovens da etnia Guarani Kaiowá que inspirados por Racionais MCs e Facção Central, cantam sobre a realidade marginalizada dos povos indígenas.
E como socioambiental se escreve junto, outros jovens artistas como Kaê Guajajara, Katú Mirim, Brisa Flow, Oxóssi Karajá, Wera MC, Oz Guarani e Kunumi MC, estão juntos com os Brô MCs nesse movimento de retomada, quebrando paradigmas e revolucionando a cena do rap nacional.
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Licenciamento ambiental do projeto da maior mina de ouro a céu aberto no Brasil é alvo de oito ações judiciais por irregularidades nos estudos de impacto ambiental
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) julgará nesta segunda-feira, dia 25 de abril, duas ações decisivas que podem abrir o caminho para o início das obras do Projeto Volta Grande, da mineradora canandense Belo Sun, em Senador José Porfírio, no Pará, e com isso abrir precedentes para licenciamentos ambientais irregulares. A empresa promete construir a maior mina de ouro a céu aberto do Brasil na Volta Grande do Xingu, na Amazônia, um dos locais com maior biodiversidade do mundo que já enfrenta os impactos da hidrelétrica de Belo Monte.
Em 2017, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) suspendeu uma segunda licença concedida pelo governo paraense, a de instalação do empreendimento, condicionando a mineradora a um processo de consulta prévia aos povos indígenas afetados, de acordo com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A Justiça também exigiu da empresa a elaboração do Estudo de Componente Indígena (ECI), nos parâmetros exigidos pela Funai (Fundação Nacional do Índio), sobre os impactos do projeto sobre povos indígenas. Na audiência do dia 25 o tribunal revisitará esse processo. A mineradora afirma ter cumprindo as exigências, que são constestadas pelo Ministério Público Federal (MPF).
Entenda o que está em jogo:
A primeira ação julgará qual órgão é competente para conduzir o licenciamento do empreendimento: o Ibama, órgão federal, ou a Semas (Secretaria Estadual do Meio Ambiente) do Pará, que hoje é responsável pelas licenças ambientais para a obra. Por considerar que Belo Sun terá impacto em projetos de assentamento federais e em terras indígenas, além dos impactos cumulativos com Belo Monte, o MPF argumenta que o licenciamento deveria ter sido conduzido pelo Ibama.
A segunda ação julga um pedido da Belo Sun sobre acórdão anterior do tribunal. Esse acórdão suspende o licenciamento do empreendimento até que seja elaborado o estudo do componente indígena nos moldes requisitados pela Funai e até que seja realizada a consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas afetados. Segundo o pedido da Belo Sun e do Estado do Pará, tanto o estudo do componente indígena quanto a consulta já teriam sido feitos.
“Se o TRF-1 julgar procedente o pedido da Belo Sun, estaremos diante de um perigoso precedente, que restringe de forma ilegal o conteúdo da consulta prevista nos artigos 6, 15 e 16 da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e sanciona a violação dos direitos humanos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais da Volta Grande do Xingu. Uma decisão nesse sentido legitimaria as ilegalidades praticadas pela Belo Sun e abriria as portas para a exploração da mais nova fronteira aurífera da Amazônia, que, se viabilizada, seguramente levará ao ecocídio, à destruição sistemática, da região já fragilizada da Volta Grande” afirma Ana Carolina Alfinito, assessora jurídica da Amazon Watch, organização que integra a Aliança Volta Grande do Xingu.
O MPF afirma que não houve consulta de fato às populações e que o estudo realizado tem falhas — pesquisadores consideram o projeto inviável. O argumento da Procuradoria é baseado em um parecer produzido em fevereiro por pesquisadores do Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Prévio Livre e Informado, a pedido do próprio MPF.
O Projeto Volta Grande da Belo Sun afeta potencialmente os povos indígenas Juruna, da Terra Indígena Paquiçamba, Arara, da Terra Indígena Arara da Volta Grande, os isolados da Terra Indígena Ituna-Itatá e os grupos indígenas “desaldeados”, isto é, aqueles que ocupam tradicionalmente territórios ainda não reconhecidos formalmente pelo Estado brasileiro. Esses grupos habitam territórios bem próximos ao local em que o empreendimento está planejado. É o caso da população que mora na Ilha da Fazenda, Ressaca e Galo, além das comunidades São Francisco (Juruna), Iawa (Kuruaya), Jericoá II (Xipaia), Kanipá (Xipaia) e Kaniamã (Xipaia). A comunidade São Francisco, por exemplo, está a apenas 600 metros da área, de modo que sofreria graves impactos diretos, o que torna ainda mais grave sua exclusão da avaliação diferenciada de impactos e do processo de consulta.
Ainda de acordo com o documento do MPF, a Belo Sun apenas coletou depoimentos das comunidades afetadas, sem que houvesse espaço para que os indígenas se manifestassem e influenciassem o projeto, como deveria ocorrer em um processo efetivo de consulta.
O parecer indica ainda que a mineradora busca classificar como consultivas reuniões com os indígenas desaldeados que tinham como objetivo declarado apenas coletar informações. Não há registros de que indígenas que foram a esses encontros tenham sido informados de que compareciam a um processo de consulta prévia para a deliberação sobre a mina de ouro.
Uma decisão de 2012 da Corte Interamericana de Direitos Humanos prevê que a consulta deveria ocorrer “em todas as fases de planejamento e desde as primeiras etapas”. A mesma decisão da Corte determina que a consulta prévia é uma responsabilidade do Estado, que não poderia ser delegada a empresas privadas, “muito menos à interessada na extração dos recursos. Há registro de reuniões em que apenas representantes da Belo Sun e de algumas das comunidades indígenas participaram, sem a presença de órgãos públicos”, destaca o parecer do Observatório.
Em depoimento à Repórter Brasil, Lorena Kuruaya conta que a comunidade Iawá, composta por membros dos povos Xipaya e Kuruaya e uma das afetadas pelo projeto da Belo Sun, encaminhou diversos pedidos à Funai para que fosse consultada, mas não obteve resposta. “Precisamos ter conhecimento sobre o projeto, sobre explosões e uso do cianeto, pois tememos o ocorrido em Brumadinho e Mariana. Até o presente momento, fomos invisibilizados do processo de consulta”, diz uma carta de 2020 assinada por membros da comunidade.
Em outro comunicado conjunto, segundo reportagem da Repórter Brasil, moradores da Iawá e das comunidades Kanipá, Jericoá I e Jericoá II informaram à Funai que nenhuma delas havia sido “procurada, consultada, ou mesmo informada” sobre as implicações do empreendimento e solicitaram mediação do órgão indigenista para apresentação de explicações, planos de execução e possíveis impactos ambientais.
“Uma decisão favorável à Belo Sun significa que o Estado brasileiro, assim como no caso de Belo Monte, vai ficar novamente do lado das grandes empresas ignorando completamente os impactos socioambientais que virão desse projeto”, aponta a advogada Marcella Ribeiro, do programa de Direitos Humanos da AIDA — Associação Interamericana para a Defesa do Ambiente. “Os polígonos que estão sendo estudados vão além da área do rio e se estendem às áreas indígenas. Em alguns anos provavelmente veremos exploração de ouro em áreas adjuntas. E caso o PL 191 seja aprovado, essas terras indígenas vão se tornar um grande garimpo”, afirma.
Falhas e impactos do projeto da Belo Sun
De acordo com especialistas, o projeto da mineradora Belo Sun na Volta Grande do Xingu tem graves falhas estruturais, as quais não foram claramente apresentadas às comunidades impactadas no processo de consulta. Estudos dos impactos ambientais realizados pela mineradora desconsideram tanto possíveis impactos sísmicos na barragem de rejeitos que seria construída quanto os impactos cumulativos que ela causaria junto com a barragem da usina de Belo Monte.
A barragem projetada para a mina teria tamanho semelhante à barragem da Vale que rompeu em Mariana em 2015, causando o maior crime ambiental do Brasil. Um parecer de especialista em Geologia e Mineração, Dr. Steven H. Emerman, diz que pelo menos nove milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos podem atingir o rio Xingu e percorrer mais de 40 quilômetros em duas horas, provocando danos irreversíveis. Esses rejeitos conteriam metais altamente tóxicos, como cianeto, arsênico e mercúrio, podendo causar o risco de ecocídio do rio Xingu pelo empreendimento.
Além disso, o projeto da Belo Sun fica a somente dez quilômetros da principal barragem no rio Xingu, construída para a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A exploração da mineradora prevê explosões 24 horas por dia para arrancar ouro da terra, durante no mínimo 12 anos. Há o risco de que as explosões impactem a estabilidade da barragem de Belo Monte e da própria Belo Sun, o que não foi considerado até agora. A própria Belo Monte, em comunicado recente, alertou para os riscos da implantação do projeto na região.
Outros estudos apontam impactos como a alteração no ciclo reprodutivo da fauna, desmatamento e/ou queimada, poluição de recurso hídrico e poluição do solo.

Aliança Volta Grande do Xingu
Esta comunicação é uma iniciativa da Aliança Volta Grande do Xingu, composta por organizações e movimentos sociais do Brasil e do mundo. A Aliança apoia a defesa da vida e da dignidade na região da Volta Grande do Xingu e sua permanente proteção contra projetos de infraestrutura como a hidrelétrica Belo Monte e a mina de Belo Sun. Compõem a Aliança: AIDA, Amazon Watch, Earthworks, International Rivers, Instituto Socioambiental — ISA, Mining Watch, Movimento Xingu Vivo para Sempre e Rede Xingu+.
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Novo relatório da Hutukara Associação Yanomami traz dados, imagens aéreas e relatos do inferno provocado pela invasão do garimpo ilegal
A Hutukara Associação Yanomami lançou nesta segunda-feira (11/4) o relatório “Yanomami Sob Ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo” — um panorama do avanço da destruição garimpeira na maior terra indígena do país.
Com uma área equivalente à de Portugal, distribuída entre os estados de Roraima e Amazonas, a Terra Yanomami completa 30 anos de demarcação em 25 de maio de 2022. Na época do decreto, o território estava tomado pelo garimpo ilegal.
Os algozes continuam os mesmos, mas com um poder de destruição muito maior. “O ataque aos povos da Terra Indígena Yanomami já ocorreu na década de 1980, com a invasão de mais de 40 mil garimpeiros. Hoje, em 2022, a história se repete. Isso é muito grave”, alerta Dario Kopenawa, vice-presidente da Hutukara.
O documento denuncia diversos ataques de criminosos contra comunidades indígenas e traz uma cronologia completa do assédio ao Palimiu em 2021 — região onde existe uma forte atuação do grupo Primeiro Comando da Capital (PCC).
Segundo dados extraídos do relatório, em 2021 o garimpo ilegal avançou 46% em comparação com 2020. No ano passado, já havia sido registrado um salto de 30% em relação ao período anterior. De 2016 a 2020, o garimpo na TIY cresceu nada menos que 3.350%, ressalta o estudo da Hutukara.
Ainda de acordo com o documento, o número de comunidades afetadas diretamente pelo garimpo ilegal soma 273, abrangendo mais de 16.000 pessoas, ou seja, 56% da população total. Existem mais de 350 comunidades indígenas na Terra Indígena, com uma população de aproximadamente 29 mil pessoas.
“A extração ilegal de ouro [e cassiterita] no território Yanomami trouxe uma explosão nos casos de malária e outras doenças infectocontagiosas, com sérias consequências para a saúde e para a economia das famílias, e um recrudescimento assustador da violência contra os indígenas”, diz a Hutukara.
De fato, conforme mostra o relatório, a malária explodiu em zonas de forte atuação garimpeira, como nas regiões do Uraricoera, Palimiu e Waikás. No Palimiu, em 2020, houve mais de 1.800 casos.
“Destaca-se que a população total do Palimiu no mesmo ano era de pouco mais de 900 pessoas, ou seja, os dados apontam para uma média de quase duas [contaminações por] malárias por pessoa”, ressalta o texto.
No começo do monitoramento, em outubro de 2018, a área total destruída pelo garimpo somava pouco mais de 1.200 hectares, com a maior parte concentrada nos rios Uraricoera e Mucajaí. Desde então, a superfície impactada mais que dobrou, atingindo em dezembro de 2021 o total de 3.272 hectares.
O crescimento se acentuou principalmente a partir do segundo semestre de 2020, coincidindo perigosamente com o recrudescimento da pandemia de Covid-19. Somente em 2021, houve um incremento de mais de mil hectares.
De acordo com o documento, dos 37 polos de saúde existentes na Terra Indígena, 18 possuem registro de desmatamento relacionado ao garimpo.
Uma foto recente, feita pelo vice-presidente da Hutukara, da estrutura da Unidade Básica de Saúde Indígena (UBSI) de Homoxi sendo engolida por uma cratera provocada pelo garimpo, gerou grande repercussão na imprensa e mídias sociais.
Registros aéreos feitos pela Hutukara para o relatório, no final de janeiro de 2022, mostram também a proximidade cada vez maior do garimpo das comunidades indígenas, além de cicatrizes imensas na floresta, poluição dos rios e o flagrante de aeronaves, helicópteros e outros equipamentos de altíssimo valor usados na atividade ilegal.
“O governo precisa avaliar suas ações, pois muitas operações de combate ao garimpo não surtiram efeito. Esse documento mostra a realidade que estamos vivendo e suas consequências, de muita violência e vulnerabilidade. O meu povo está sofrendo. Pedimos o apoio da população para se unir ao nosso grito de socorro para a retirada imediata dos garimpeiros do nosso território”, convocou Dario Kopenawa.
O documento finaliza com uma série de recomendações ao Poder Público e destaca que o garimpo não é um problema sem solução, mas demanda vontade política para garantir uma atuação eficiente e coordenada do Estado e a articulação entre os órgãos e agentes responsáveis.
Principais fatores para o salto do garimpo ilegal na Terra Yanomami
- Aumento do preço do ouro no mercado internacional
- Falta de transparência na cadeia produtiva do ouro e falhas regulatórias que permitem fraudes na declaração de origem do metal extraído ilegalmente
- Fragilização das políticas ambientais e de proteção a direitos dos povos indígenas e, consequentemente, da fiscalização regular e coordenada da atividade ilícita em Terras Indígenas
- Agravamento da crise econômica e do desemprego no país, produzindo uma massa de mão de obra barata a ser explorada em condições de alta precariedade e periculosidade
- Inovações técnicas e organizacionais que permitem às estruturas do garimpo ilegal se comunicar e se locomoverem com muito mais agilidade
- A política do atual governo de insistente incentivo e apoio à atividade apesar do seu caráter ilegal, produzindo assim a expectativa de regularização da prática
Relatos
O relatório também traz relatos impressionantes da violência sofrida por mulheres e crianças por parte de garimpeiros. Segundo os depoimentos, coletados por pesquisadores indígenas, garimpeiros estariam as abusando sexualmente após embriagar pessoas das comunidades assediadas.
Leia trechos de relato registrado por um dos pesquisadores indígenas:
“Após os Yanomami solicitarem comida, os garimpeiros rebatem sempre. (…) ‘Vocês não peçam nossa comida à toa! É evidente que você não trouxe sua filha! Somente depois de deitar com tua filha eu irei te dar comida!’.
‘Se você tiver uma filha e a der para mim, eu vou fazer aterrizar uma grande quantidade de comida que você irá comer! Você se alimentará!’.
Os [garimpeiros] dizem: ‘Essa moça aqui. Essa tua filha que está aqui, é muito bonita!’. Então, os Yanomami respondem: ‘É minha filha!’. Quando falam assim, os garimpeiros apalpam as moças. Somente depois de apalpar é que dão um pouco de comida.
Os garimpeiros têm relação somente com as mulheres que tomaram cachaça. Os garimpeiros não conseguem com as mulheres que não tomaram cachaça.”
Na visão da maioria das mulheres indígenas, afirma o relatório, os garimpeiros representam uma terrível ameaça. São violentos, produzindo um clima de terror permanente nas aldeias.
Assim registra uma pesquisadora indígena a partir de uma entrevista com outra mulher Yanomami:
“Quando as pessoas disseram que eles se aproximavam, eu fiquei com medo. Por isso, desde que ouço falar dos garimpeiros, eu vivo com angústia.
De fato, as pessoas agora pensam: ‘Depois que os garimpeiros que cobiçam o ouro estragaram as vaginas das mulheres, fizeram elas adoecer’. Por isso, agora, as mulheres estão acabando, por causa da letalidade dessa doença. É tanto assim que, em 2020, três moças, que tinham apenas por volta de 13 anos, morreram.
Elas eram novas, tendo apenas tido a primeira menstruação. Após os garimpeiros terem provocado a morte dessas moças, os Yanomami protestaram contra os garimpeiros, que se afastaram um pouco. As lideranças disseram para eles que estando tão próximos, se comportam muito mal.”.
Moradores da região do Rio Apiaú relataram à Hutukara que um garimpeiro que trabalha na região ofereceu drogas e bebidas aos indígenas e, quando todos já estavam bêbados e inertes, estuprou uma das crianças da comunidade.
Em uma outra denúncia, se narra um “casamento” arranjado de uma adolescente Yanomami com um garimpeiro mediante a promessa de pagamento de mercadoria, que nunca foi cumprida.
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Boletim Sirad Isolados registrou nos primeiros dois meses de 2022 fortes pressões em territórios com frágil ou nenhuma proteção da Funai
Indígenas isolados de quatro Terras Indígenas estão em perigo. A Fundação Nacional do Índio (Funai) ainda não renovou as portarias de restrição de uso das terras Jacareúba/Katawixi (AM) e Piripkura (MT), que venceram em dezembro de 2021 e março de 2022, respectivamente. As portarias das Terras Indígenas Pirititi (RR) e Ituna-Itatá (PA) foram renovadas por apenas seis meses e, em breve, elas também estarão desprotegidas.
Enquanto isso, a invasão de criminosos aos quatro territórios continua a todo vapor, gerando desmatamento e colocando em risco a vida dos povos indígenas que vivem em isolamento. E o panorama também é preocupante em outras terras indígenas no Brasil com a presença de isolados.
De acordo com o Boletim Técnico Bimestral Sirad-Isolados (Sirad-I), produzido pelo Instituto Socioambiental (ISA), nos primeiros dois meses de 2022, 116 hectares foram desmatados e 91 alertas foram emitidos em 20 TIs com isolados.
Baixe o Boletim Sirad Isolados
Para o programa de Monitoramento do ISA, é nítido que a pressão é maior no entorno dos territórios sem demarcação concluída e com portarias de restrição de uso vencidas ou prestes a vencer.
Em 17 de março, quando a proteção da TI Piripkura venceu, foi revelado que, por pouco, 12 mil hectares quase foram vendidos em um leilão, sem qualquer interferência da União ou do governo do estado.
A área faz parte da fazenda Concisa, que está sobreposta à TI Piripkura, e foi usada por uma construtora para quitar dívidas na Justiça. A denúncia foi feita via Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi).
O processo de demarcação do território se arrasta por quase 40 anos. Enquanto isso, um mecanismo legal protege a Terra Indígena. Recentemente, a portaria de restrição de uso dos Piripkura foi renovada por apenas seis meses, período insuficiente para a concretização de ações de retirada de invasores, e já venceu.
Esse não é um caso isolado. Dados do Sistema de Cadastro Ambiental Rural (CAR) revelam imóveis ilegais registrados sobre Terras Indígenas. Na TI Piripkura, já são 131.870 hectares de propriedades ilegais cadastradas.
A incidência de crimes nestes territórios, como desmatamento, grilagem e garimpo, seguem em curso enquanto curtos prazos de proteção são estabelecidos pela Funai.
Durante os seis meses de vigor da portaria, a Funai nada tem feito para proteger esses territórios e os indígenas isolados que vivem neles. A inércia do governo estimula invasores que ocupam ilegalmente esses territórios e os destroem, pontua o boletim do ISA.
A proteção da TI Pirititi, por exemplo, vencerá em julho. Coincidentemente, a pressão aumentou de forma vertiginosa ao redor da TI. De novembro de 2021 a janeiro de 2022, foram detectados sete novos pontos ilegais de desmatamento a menos de 2 km da TI, sendo que um deles já invadiu o território.
“Os Pirititi serão colocados em situação de extrema vulnerabilidade com o fim da vigência da Portaria de Restrição de Uso e a passagem do Linhão do Tucuruí pela TI, o que preocupa cada vez mais o povo Waimiri-Atroari e os pesquisadores com o potencial impacto negativo que isso pode trazer”, afirma o documento.
Territórios em risco
Outros povos indígenas isolados também vêm sofrendo com o avanço de invasores em suas terras.
Neste bimestre, o Boletim Sirad-Isolados detectou um desmatamento de 16 hectares na Terra Indígena Zoró, no Mato Grosso, além de dois novos pontos de garimpo, concentrados próximo ao limite sul do território.
Apesar de sua terra já ter sido regularizada e homologada, o povo Zoró sofre com a pressão do garimpo ilegal. O boletim verificou que 22.724 hectares já foram desmatados – o equivalente a 6,38% do território.
No Maranhão, na Terra Indígena Alto Turiaçu, regularizada e homologada, 12 hectares foram desmatados no primeiro bimestre do ano. São aberturas para a retirada ilega de madeira de dentro da TI. Os isolados do Alto Turiaçu já perderam 44.326 hectares de floresta em razão do desmatamento, o equivalente a 8,35% de seu território.
Ainda no primeiro bimestre, a Terra Indígena Munduruku, localizada no Pará, teve 72 hectares desmatados e um total de 68 alertas foram emitidos pelo Boletim Sirad-Isolados. De acordo com o documento, “todo um dia um novo ponto de garimpo cresce às margens dos rios, e muitos pontos que já foram desativados, voltam a operar”.
Em fevereiro, a Polícia Federal concluiu que a mudança de cor nas águas do Rio Tapajós foi provocada pelo garimpo ilegal e pelo desmatamento na região. A mudança na coloração do rio é decorrente do aumento de sedimentos e é causada pela saturação de mercúrio e cianeto, metais químicos que ajudam na extração do ouro.
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Dizer que o presidente Jair Bolsonaro mentiu é chover no molhado. Mas, dessa vez, ele se valeu da guerra na Ucrânia para golpear os direitos indígenas. Mentiu ao dizer que a solução para a dependência brasileira das importações de fertilizantes da Rússia - que enfrentam dificuldades logísticas em decorrência das sanções econômicas impostas por vários países por conta da invasão da Ucrânia - depende da exploração de jazidas nas terras indígenas do povo Mura, situadas no baixo Rio Madeira (AM).
Ato contínuo, o líder do governo, Ricardo Barros, coletou assinaturas da bancada governista para votar, em regime de urgência, o Projeto de Lei 191/2020, de iniciativa do Executivo. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, indicou que pretende colocá-lo em votação nesta quarta-feira (9/3), sem que tenha sido discutido em qualquer comissão técnica ou especial. Eles avaliam ter votos suficientes para aprová-lo, oriundos dos deputados amarrados pelo tal orçamento secreto e dispostos a endossar, sem ler, qualquer proposta de interesse do governo.
O Projeto Autazes, que pretende explorar o principal depósito de potássio já pesquisado dessa região, está em fase de licenciamento ambiental. Ele envolve uma área próxima, mas que não incide diretamente nas terras Mura. Portanto, a sua execução não depende da regulamentação da mineração em terras indígenas (TIs). Bolsonaro encenou uma farsa para seus comparsas imporem a urgência da votação sem que o PL tenha relação efetiva com o suprimento de fertilizantes.
Um levantamento feito pelo Instituto Socioambiental (ISA) revelou que os requerimentos para extração de sais de potássio no interior das TIs representam apenas 1,6% das jazidas requeridas para exploração. Para a substância fosfato, os pedidos representam ínfimos 0,4% do total de jazidas requeridas na Agência Nacional de Mineração (ANM). As informações hoje disponíveis desmentem o presidente e demonstram que quase todos os depósitos conhecidos, ou a serem pesquisados, estão fora das terras indígenas. Confira o estudo do ISA:
A análise dos requerimentos minerários cadastrados na Agência Nacional de Mineração (ANM) reflete o interesse minerário conhecido sobre as jazidas minerais no Brasil. Ela mostra que os requerimentos para as substâncias com interesse para fertilizantes agrícolas apresentam pouca ou nenhuma relevância quando se trata de requerimentos incidentes em terras indígenas e unidades de conservação, especialmente se comparados com os requerimentos localizados fora dessas áreas protegidas.
Atualmente existem apenas 25 requerimentos minerários de sais de potássio e fosfato incidentes sobre Terras Indígenas, em uma área total de pouco mais de 76 mil hectares, enquanto que fora dessas áreas há 4.336 requerimentos cadastrados na ANM para esses minerais, totalizando mais de 10 milhões de hectares (extensão equivalente ao estado de Pernambuco).
Para o potássio, existem 408 requerimentos numa área total de 2.457.657,2 hectares; para o fosfato, são 3.928 requerimentos, totalizando 7.787.921,3 hectares. A área total desses requerimentos é muito superior (mais de 13 mil por cento) do que a área requerida incidente em TIs. Isso demonstra que são irrelevantes, do ponto de vista estratégico para o país, os requerimentos incidentes nas terras indígenas cadastrados na ANM para extrair substâncias de interesse para os fertilizantes agrícolas.
Ademais, a enorme quantidade e disponibilidade de requerimentos fora das TIs poderia oferecer melhores opções de exploração em termos de demanda por infraestrutura, matriz energética e mitigação de impactos socioambientais.
O PL 191/2020 afronta a Constituição ao pretender legalizar o garimpo predatório, ao destituir de direitos os povos que vivem em terras cuja demarcação não tenha sido homologada e ao rejeitar a eventual negativa no processo de consulta às comunidades afetadas. O PL também autoriza, à revelia das comunidades, a construção de estradas, hidrelétricas e o plantio de sementes transgênicas em terras indígenas. Além de inconstitucional, é altamente predatório.
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Arthur Lira quer, de novo, jogar a sujeira no colo do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que coleciona propostas nefastas vindas da Câmara, como a que torna meramente declaratório o processo de licenciamento ambiental, a que estimula a grilagem de terras públicas e a que libera a venda de agrotóxicos não autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Se o Senado não barrar mais essa investida, a matéria será levada ao Supremo Tribunal Federal (STF).
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