Entre os dias 8 e 10 de agosto de 2024, coletores de sementes nativas e técnicos das redes da Terra do Meio (PA) e de Roraima estarão em Nova Xavantina (MT) para conhecer como funciona a Rede de Sementes do Xingu. A programação reforça a importância do trabalho em rede para o desenvolvimento das cadeias produtivas da restauração e da sociobiodiversidade.
O objetivo do intercâmbio entre as redes articuladas ao Redário é, além de proporcionar a troca de experiências entre grupos de coletores em diferentes estágios de desenvolvimento, capacitá-los em gestão, beneficiamento de algumas espécies, armazenamento, coleta e uso de casas de sementes.
No encontro, as três redes de sementes, apoiadas diretamente pelo Instituto Socioambiental (ISA), também terão a oportunidade de conhecer áreas de restauração e os “quintais produtivos” de coletores da ARSX.
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Preparo de muvuca de sementes durante a 4ª Expedição de Restauração Ecológica da Rede de Sementes do Xingu e do ISA|Bianca Moreno/ARSX/ISA
Danielle Celentano, analista sênior do ISA e responsável pelo projeto Modelos de Restauração Produtiva para a Amazônia, afirma que intercâmbios como este evidenciam a potência do trabalho em rede. “A Rede de Sementes do Xingu acumula uma experiência super importante para acelerar o desenvolvimento e fortalecer redes de sementes mais jovens. Esse intercâmbio, com apoio da União Europeia, mostra a importância da articulação em rede para o desenvolvimento das cadeias produtivas da sociobiodiversidade e da restauração”.
PROGRAMAÇÃO
08/08
Manhã
História, números da ARSX
Troca de experiências
Qualidade de sementes
Tarde
Visita à Casa de Sementes
09/08
Manhã
Visita à Chácara da coletora Valdivina - Vivência de coletor
Visitação à reserva da propriedade, produção de mel, coleta de sementes e área de restauro
Tarde
Conversa sobre o papel do elo, divisão de pedido e beneficiamento.
10/08
Manhã
Visita a área de Mariozam
Roda de conversa, considerações, encerramento.
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Indígenas, quilombolas e extrativistas de MT e PA trocam experiências sobre programas de REDD+ jurisdicional
Intercâmbio em Belém (PA) discutiu critérios de repartição de benefícios, direito à consulta e mecanismos de salvaguardas em programas jurisdicionais de REDD+
Intercâmbio reúne lideranças de organizações de povos e comunidades tradicionais do Mato Grosso e do Pará para debater REDD+ jurisdicional 📷 Leonor Costa/ISA
Lideranças indígenas, quilombolas e extrativistas dos estados do Pará e de Mato Grosso se reuniram em Belém (PA) para trocar experiências, informações e conhecimentos sobre os programas jurisdicionais de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, Manejo Sustentável e Aumento do Estoque de Carbono).
Foram três dias de debates intensos entre 16 e 18 de julho à beira do Rio Guamá, que desaguaram no consenso de que é fundamental que povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais se articulem para o diálogo sobre as ações e iniciativas que envolvem o mercado de crédito de carbono no Brasil e as formas de enfrentar a emergência climática.
O salão do hotel que recebeu o evento ficou pequeno para tantas trocas de experiência e de saberes entre quem mais tem conhecimento sobre como conservar e manejar florestas, águas, biomas e roças onde desenvolvem seus modos de vida.
O evento, organizado pelo Instituto Socioambiental (ISA) com o apoio do Environmental Defense Fund (EDF), contou com cerca de 60 pessoas, representando a Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (FEPOIMT), a Associação da Comunidade Negra Rural Quilombo Ribeirão da Mutuca (Acorquerim), a Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (FEPIPA), a Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará - Malungu, o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e a Rede Xingu+.
Temas como consulta prévia, livre e informada, repartição de benefícios, salvaguardas socioambientais e governança em programas de REDD+ foram o fio condutor dos três dias de intercâmbio.
O ponto de partida foi a experiência de Mato Grosso, que desde 2017 tem o seu programa de REDD+ jurisdicional, denominado de Programa REM (sigla para Redd Early Movers).
Juliana Maia, analista de políticas climáticas do ISA, explica que a ideia de realizar o intercâmbio surgiu a partir de uma demanda das redes dos povos e comunidades tradicionais que acompanham a elaboração do programa do Pará, de trocar conhecimentos sobre como se deu o processo de construção do programa de REDD+ em Mato Grosso.
“A gente pensou no intercâmbio a partir de uma demanda dos povos do Pará, visando realizar uma troca de experiências e informações com os povos de Mato Grosso, a partir do programa REM-MT. Organizamos esse momento de diálogo entre as organizações, tendo por princípio o protagonismo das próprias comunidades”, explicou.
Para Juliana Maia, o intercâmbio possibilitou ampliar o diálogo entre as organizações dos dois estados sobre programas jurisdicionais de REDD+ e o mercado de carbono, a partir das experiências dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais em torno dessa pauta.
“O resultado foi ouvir os representantes de Mato Grosso, que possuem uma grande experiência na elaboração e implementação do REM. Esse intercâmbio propiciou a aproximação de diferentes experiências e o aporte de novos elementos na discussão técnica e política por meio do diálogo entre as organizações”.
Programa REM e a participação das comunidades
A presidente da FEPOIMT, Eliane Xunakalo, indígena do povo Kurã Bakairi, contextualizou como foi a participação dos povos indígenas na elaboração do programa no Mato Grosso.
“A gente foi participando [do processo de elaboração do programa] e teve um momento que o governo disse que era para apresentar projetos. E a gente disse que não ia apresentar nenhum projeto, que era necessário ter uma consulta a todos os povos e que não tínhamos nenhuma autonomia para decidir”, relembrou, durante sua apresentação sobre o programa REM.
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Eliane Xunakalo, presidente da FEPOIMT, fala sobre o programa REM de Mato Grosso durante encontro em Belém (PA) 📷 Leonor Costa/ISA
A presidente da FEPOIMT pontuou, ainda, os desafios para envolver outras lideranças indígenas das comunidades em razão da complexidade do tema e das dificuldades de compreensão de como funcionaria o programa de REDD+ jurisdicional, como seriam a repartição de benefícios e os retornos para os territórios indígenas, além da pressão do governo para que o projeto fosse logo finalizado.
“A gente reuniu todas as nossas lideranças num seminário e discutiu como nós iríamos fazer para que isso chegasse à base. Mas a gente queria que isso estivesse na boca das pessoas. A gente queria provocar a curiosidade”, disse Eliane Xunakalo, pontuando, ainda, como foi dado o recado ao governo: “Vocês precisam encontrar tempo para nos ouvir. E se for a vontade de todo o grupo, a gente entra. Mas se não for, a gente não entra”, contou.
A decisão final aconteceu em 2018, numa assembleia realizada no Território Indígena do Xingu (TIX), quando as lideranças presentes aprovaram a participação dos povos indígenas de Mato Grosso na elaboração do REDD+ jurisdicional.
“No início se discutia entre 8 e 9% para os povos indígenas. E a gente disse não, porque nós somos 43 povos, estamos em três biomas e nós cuidamos de 16% do que está em pé em Mato Grosso. Então não seria justo. E a gente foi negociando e conseguindo aliados e a gente conseguiu 13% na época”, disse, explicando como foi a definição da repartição de benefícios.
A representante da Associação da Comunidade Negra Rural Quilombo Ribeirão da Mutuca, Iolanda Ferreira, relatou que durante as negociações em torno do REM, o movimento quilombola tentou garantir a inclusão de um subprograma quilombola, conforme ocorreu com os povos indígenas, mas o governo de Mato Grosso não atendeu a reivindicação.
“A nossa experiência com o REM teve lados positivos, mas negativos também. Mas a comunidade conseguiu incidir de alguma forma nessa experiência e tivemos alguns retornos, como realização de oficinas de capacitação, a aquisição de equipamentos e o selo quilombola, que ajuda na comercialização dos produtos”.
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Durante o encontro em Belém, os participantes se dividiram em grupos para aprofundar as discussões dos temas apresentados 📷 Leonor Costa/ISA
O programa REM de Mato Grosso está em sua segunda fase, oportunidade em que serão sugeridos ajustes e mudanças. Para esse novo momento, Eliane Xunakalo espera ter resultados ainda mais positivos, com participação ainda mais ampla dos povos indígenas e das demais comunidades tradicionais, com protagonismo também para outras organizações de base.
“O desafio é novamente que o Estado nos ouça. Que dialogue conosco e que essa segunda fase seja construída de modo mais participativo. E que as coisas não venham de cima para baixo, mas que sejam construídas com o nosso olhar e com a gente e para a gente. Nós ainda vamos discutir entre nós, e espero que tenhamos resultados melhores do que foi a primeira fase do REM”.
Ewésh Yawalapiti Waurá, advogado e diretor executivo da Associação Terra Indígena Xingu (ATIX), também considerou a necessidade de que a próxima fase do REM de Mato Grosso reconheça ainda mais a participação dos povos e comunidades tradicionais.
“Esperamos que nessa próxima etapa de construção haja mais participação das comunidades de base, das organizações indígenas de Mato Grosso. É importante a nossa participação para que a gente tenha uma negociação igualitária e possa realmente influenciar na decisão junto ao estado, na hora da construção da nova fase do programa de Redd+”, defendeu Ewésh, que estava representando a Rede Xingu+.
Reivindicações em processo no Pará
No final de 2022, após assinar contrato de financiamento com a Iniciativa Internacional para o Clima e Florestas da Noruega (NICFI), da Noruega, o governo do estado do Pará formalizou o início dos trabalhos de elaboração do Sistema Jurisdicional de REDD+ do Pará, num processo liderado pelo Comitê Gestor do Sistema Estadual sobre Mudanças Climáticas (Coges), da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.
Como resultado da atuação intensa entre as redes de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, lideranças do CNS, da FEPIPA e da Malungu garantiram participação no grupo de trabalho, apresentando suas reivindicações e posicionamentos sobre como devem ser os critérios de repartição de benefícios, o sistema de salvaguardas socioambientais e os procedimentos para realização de consulta prévia, livre e informada. No Coges, o ISA acompanha os trabalhos como suplente nas vagas destinadas a organizações não governamentais.
A previsão de que a COP 30 (Conferência das Partes) aconteça em Belém, em novembro de 2025, tem interferido na dinâmica do processo de construção do Sistema Jurisdicional de REDD+ do Pará. O governo do Pará tem como meta que o programa já esteja em fase de implementação na ocasião da COP e, para isso, precisaria concluir essa etapa de elaboração.
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Representante da FEPIPA, Concita Sõpré explica a participação dos povos indígenas na construção do programa do Pará 📷 Leonor Costa/ISA
Durante o intercâmbio, Concita Sõpré, presidenta da FEPIPA, explicou que um dos desafios tem sido levar as propostas em discussão para os territórios indígenas, ação que demanda tempo, sobretudo pelo tamanho do estado do Pará. E apontou, ainda, a preocupação sobre os benefícios que o programa trará ao território e o respeito ao processo de consulta aos povos.
“O que nós não queremos aqui no estado do Pará, é que a gente discuta e, no final, a gente não tenha condições de nós, enquanto organização, termos acesso a esses recursos. Porque, mais uma vez, a floresta está lá nos nossos territórios. Fazemos isso de graça? Não, fazemos isso com o nosso corpo, com as mortes dos que já lutaram por aquele território. O crédito está lá, o carbono está lá, o estoque está lá, e alguém vem agora, quer pegar e vender. Como sempre: nós somos os donos, mas alguém quer vender”, provocou.
O diretor da Malungu, Aurélio Borges, advogado e integrante do Quilombo Macapazinho, em Santa Izabel (PA), explicou que o foco da organização é debater com as comunidades quilombolas as propostas apresentadas pelo governo e disse que a Malungu realizou algumas oficinas regionais.
“Essas oficinas nos deram o subsídio para que a gente possa discutir e propor aquilo que a gente entende que vai ser benéfico para as comunidades quilombolas”, reforçou.
Segundo Aurélio Borges, a maior preocupação nessa fase da construção do programa é avançar em uma proposta que garanta repartição de benefícios justa e mecanismos de salvaguardas, respeitando o direito previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina o direito à consulta prévia, livre e informada, e o Acordo de Cancún, que prevê salvaguardas socioambientais em projetos de REDD+.
“Nosso grande desafio para o próximo período é garantir, dentro da repartição de benefícios e das salvaguardas, os direitos constitucionais das comunidades quilombolas e tudo aquilo que a gente vem propondo no decorrer desse percurso da política estadual de REDD+ no estado do Pará. Então eu espero que o nosso direito seja assegurado, que as nossas propostas sejam acatadas pelo estado e que essa política seja uma política que leve garantia de direitos para o nosso povo".
Soraya Almeida, liderança do CNS, defendeu que as comunidades tradicionais, como as populações extrativistas, tenham protagonismo nessa fase de construção do programa do Pará.
“Nós não podemos ficar de fora desse processo do REDD+. E temos explicado às nossas bases que essa é uma forma da gente acessar os benefícios pela proteção do meio ambiente, pela proteção da floresta, com povos e com gente. Por isso, desde o início temos dialogado sobre esse assunto. A gente quer que essas populações que vivem na floresta recebam, também do ponto de vista financeiro, apoio por esse serviço prestado, além de ter tecnologias que ajudem nos trabalhos ainda muito difíceis”, disse.
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Representantes do ISA, da Rede Xingu+, do CNS, da FEPIPA, da FEPOIMT e da Malungu abrem os debates 📷 Leonor Costa/ISA
O que é o mecanismo de REDD+ jurisdicional?
No contexto da discussão climática global nas Conferências das Partes (COP), da Organização das Nações Unidas (ONU), o mecanismo de REDD+ foi pensado para incentivar países detentores de grandes extensões florestais a manter suas vegetações nativas, reduzindo assim a emissão de gases de efeito estufa (GEE) provenientes da destruição e degradação dessas vegetações. Em um mecanismo de REDD+, países que são emissores históricos financiam a conservação de ambientes florestais em outros países, estes que não são grandes emissores quando comparados à média global.
Nos projetos locais de carbono, os territórios, propriedades privadas ou Estados que detêm vegetações nativas e estoques de carbono, recebem diretamente pelos créditos do carbono ali estocados. Esses créditos servem para neutralizar as emissões de gases de efeito estufa de diversos poluentes. Já o mecanismo de REDD+ jurisdicional é diferente. Primeiro porque é uma negociação entre Estados nacionais e subnacionais (ou por jurisdições legalmente delimitadas); segundo, o jurisdicional funciona como um programa cujas iniciativas estão todas integradas (são importantes os estoques mas também o fluxo de carbono); terceiro porque paga-se por não emitir os GEE oriundos de florestas, isto é, o que não foi desmatado e degradado vira uma espécie de "prêmio" que, no caso de um programa jurisdicional, vai direcionado para o Estado executar.
Para o recurso sair de um país e financiar o programa de REDD+ de um outro país (ou jurisdição) é necessário tomar decisões de alta complexidade, como: quais as formas que o Estado possui para executar esse recurso? Como esse recurso será repartido nos países e estados destinatários? Quais impactos terão esses recursos na vida das pessoas no país de destino? O que pensam, afinal, os verdadeiros donos da floresta (os povos originários e comunidades tradicionais) sobre um programa jurisdicional e sobre o valor de compensação pelas reduções de emissões?
Nos mecanismos de REDD+ pensados e aplicados no Brasil, o Estado é o beneficiário direto e dele partirão as decisões de repartição de benefícios. Sendo assim existe uma disputa para dentro e para fora do Estado sobre como esse recurso será partilhado e sobre como as "fatias do bolo" serão distribuídas, dependendo de fatores políticos, o que inclui a articulação de movimentos sociais de povos e comunidades tradicionais e da sociedade civil.
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Nota de pesar pelo falecimento do Cacique Kotok Kamaiurá
Grande liderança do Xingu, ele era conhecido pela luta constante pela valorização da cultura dos povos indígenas
O Instituto Socioambiental (ISA) lamenta profundamente o falecimento do Cacique Kotok Kamaiurá, nesta terça-feira (30/07).
Uma das grandes lideranças indígenas do Território Indígena do Xingu (TIX), Kotok Kamaiurá atuava desde a juventude em favor do bem-estar das comunidades, do fortalecimento da cultura e no combate às ameaças ao território.
Filho do grande pajé Takumã Kamaiurá, herdou o cacicado de seu pai. Kotok aprendeu a arte da diplomacia alto-xinguana com Takumã desde jovem, época em que os irmãos Villas-Bôas criaram o Parque Indígena do Xingu.
Kotok liderou o povo Kamaiurá durante as décadas em que seu povo viu crescer a ocupação do entorno do território, o desmatamento comprometer as nascentes do Rio Xingu e novos desafios surgirem.
Ao lado de outros grandes caciques do Xingu, como Aritana e Raoni, Kotok participou de incontáveis mobilizações políticas em defesa dos direitos indígenas. Casou com quatro mulheres e teve dezenas de filhos, netos e bisnetos.
Seguindo a tradição Kamaiurá, em breve terão início os preparativos para o ritual fúnebre do Kwarup em homenagem a Kotok, que deverá se realizar por volta do mês de agosto de 2025, quando se encerrará o ciclo do luto.
Seu legado de luta e resistência continuará a inspirar as futuras gerações.
O ISA expressa solidariedade aos familiares e amigos neste momento de tristeza.
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Cacique Kotok Kamaiurá durante o evento Parque Indígena do Xingu+50, em julho de 2011|Claudio Tavares/ISA
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Em agendas na ONU, aliança indígena cobra ações efetivas do Brasil contra o garimpo
Lideranças Kayapó e Ye’kwana denunciaram em Genebra, na Suíça, os impactos da atividade ilegal em seus territórios e na saúde das populações
A Aliança em Defesa dos Territórios, composta pelos povos Kayapó, Yanomami e Munduruku, realizou, no dia 10 de julho, um evento paralelo na sede da ONU em Genebra sobre os impactos do garimpo ilegal de ouro na Amazônia brasileira.
O objetivo foi promover um diálogo entre as lideranças presentes – Julio Ye’kwana, presidente da Associação Wanasseduume Ye'kwana (Seedume) e Doto Takak Ire, presidente do Instituto Kabu –, órgãos da ONU, o governo brasileiro e a sociedade civil.
A mesa, que foi co-organizada pela Rede de Cooperação Amazônica (RCA) com apoio do Instituto Socioambiental (ISA), Greenpeace, Instituto Iepé, Rainforest Foundation Norway e Instituto Raça e Igualdade, integrou a programação oficial de eventos paralelos da 17ª sessão do Mecanismo de Peritos sobre os Direitos dos Povos Indígenas (EMRIP) da ONU.
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Da esquerda à direita: Luis Donisete, secretário executivo da RCA, Todd Howland, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), Julio Ye'kwana, presidente da Seedume, Marina Vieira, assessora da aliança, Doto Takak Ire, presidente do Instituto Kabu, Anexa Alfred Cunningham, do EMRIP e Manoela Pessoa De Miranda, do Secretariado da Convenção de Minamata|Isis Alves
O evento fez parte de uma ampla agenda de incidência política da Aliança em Genebra para provocar o governo brasileiro a agir de forma mais efetiva no combate ao garimpo ilegal do ouro no país. Nos dias 8 e 9 de julho, as duas lideranças presentes em Genebra discursaram na plenária principal do EMRIP.
“É importante a gente falar na ONU para que conheçam internacionalmente a nossa luta”, ressaltou Julio Ye’kwana. Ao longo da semana, as lideranças reiteraram que, apesar de o governo federal ter mudado, a correlação de forças no poder, principalmente no Legislativo, ainda os desfavorece e impede que as ações de proteção aos seus territórios avance.
Em suas falas, os dois representantes da Aliança ressaltaram o papel dos povos indígenas na proteção da natureza e na mitigação das mudanças climáticas: “Nós protegemos a floresta, nós protegemos o mundo. E fazemos isso para continuarmos vivendo”, sublinhou Julio Ye’kwana.
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Julio Ye'kwana discursa na plenária principal do EMRIP da ONU, em Genebra|Marina Vieira
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Doto Takak Ire pediu o fim do garimpo em Terras Indígenas na plenária principal do EMRIP|Luis Donisete Grupioni
“Hoje sofremos com o garimpo e com a contaminação dos nossos rios, dos nossos peixes. O ouro é sagrado, ele tem que ficar no subsolo, não é para retirar de lá. Queremos continuar a beleza que temos em nossas florestas. Que os espíritos da floresta continuem protegendo a nossa vida e os povos indígenas protegendo as florestas, como sempre fizemos”, continuou o presidente da SEDUUME.
“Não somos nós, povos indígenas, que estamos desmatando: são os próprios brancos que estão querendo acabar com o mundo”, acrescentou Doto Takak Ire, presidente do Instituto Kabu.
Assista às falas completas das lideranças em Genebra:
Também compuseram a mesa palestrantes engajados com os direitos dos povos indígenas dentro do sistema das Nações Unidas. Todd Howland, representante do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH), abriu o evento fazendo referência à crítica situação em Minamata, no Japão.
Na década de 1950, resíduos industriais com alta concentração de mercúrio foram despejados na baía de Minamata, no Japão, contaminando mais de 50 mil pessoas, das quais ao menos duas mil desenvolveram o que veio a ser conhecida como a doença de Minamata. A Fiocruz demonstrou que crianças dos povos Munduruku e Yanomami já apresentam sintomas dessa doença em pesquisas realizadas em 2020 e 2024, respectivamente.
A doença de Minamata causa danos neurológicos e pode ter, entre seus sintomas, descoordenação e fraqueza musculares, paralisia, perda da audição e da fala. Em casos mais graves, pode levar à malformação fetal e à morte.
No garimpo, o mercúrio é usado para separar o ouro de outros materiais. Os resíduos da substância são incorporados na cadeia alimentar local e acabam contaminando quem se alimenta dos peixes, por exemplo, em especial comunidades indígenas e ribeirinhas.
Em 2023, 148 países – incluindo o Brasil – assinaram a Convenção de Minamata sobre o Mercúrio da ONU, assumindo obrigações para reduzir o efeito negativo do uso do mercúrio na biodiversidade e na saúde dos povos indígenas. Howland chamou atenção para o fato de que empresas e compradores de ouro estão impondo violações aos direitos humanos dos povos indígenas e propôs a eliminação total do uso de mercúrio, a garantia do direito à consulta prévia dos povos indígenas, o acesso à informação, incluindo dados sobre contaminação, e a proteção do direito à saúde das populações afetadas. “A saúde e a proteção da vida são uma obrigação de todos”, lembrou.
Manoela Pessoa, do Secretariado da Convenção de Minamata, afirmou que o mercúrio é um produto barato e fácil de se comprar, inclusive pode ser encontrado na internet. No Brasil, sua comercialização é regulada, mas continua sendo contrabandeado em larga escala. Para Pessoa, é urgente a retirada dos garimpeiros das Terras Indígenas, o monitoramento contínuo das pessoas contaminadas o combate ao comércio ilegal do mercúrio e do ouro.
Por fim, Luis Donisete Grupioni, secretário-executivo da RCA e do Instituto Iepé, afirmou que o garimpo ilegal de ouro na Amazônia é hoje uma atividade permeada por uma rede de ilícitos: “O garimpo está intimamente associado ao tráfico de mercúrio, drogas e armas; é uma atividade complexa, que envolve infraestrutura de equipamentos, recursos financeiros e associação criminosa de empresas suspeitas de fraude na compra e venda de ouro”.
Grupioni lembrou que o avanço da atividade sobre as Terras Indígenas também ameaça os últimos povos indígenas em isolamento voluntário na Amazônia.
Recomendações ao governo brasileiro
Todas as falas convergiram ao menos em quatro recomendações urgentes ao governo brasileiro:
- Desintrusão completa e permanente de todos os territórios indígenas invadidos;
- Monitoramento e tratamento das pessoas contaminadas por mercúrio;
- Regulamentação da cadeia do ouro no Brasil, com a criação de mecanismos de rastreabilidade da origem;
- Controle do uso do mercúrio.
A Aliança reuniu-se ao longo da semana com diferentes mecanismos e procedimentos da ONU, entre eles, a responsável pelo Brasil no ACNUDH e as assessorias dos Relatores Especiais sobre Discriminação Racial e sobre Empresas e Direitos Humanos, com o objetivo de informar sobre as violações aos direitos humanos causadas pelo garimpo ilegal na Amazônia.
A denúncia de Julio Ye'kwana, na plenária principal da sessão do EMRIP, no dia 9 de julho, chamou atenção da vice-presidente do EMRIP, a norte-americana Dalee Sambo Dorough, e do relator especial sobre Direitos dos Povos Indígenas, Francisco Calí Tzay,que convocaram o governo brasileiro a agir imediatamente na situação da Terra Indígena Yanomami.
A perita do EMRIP pela América Latina, Anexa Brendalee Cunningham, que também compôs a mesa do evento paralelo com a Aliança no dia 10 de julho, afirmou que os povos indígenas estão numa luta constante por seu direito à terra no Brasil e em outros países do mundo. E que é importante que haja um diálogo com o governo para encaminhar soluções para os problemas dos direitos coletivos dos povos indígenas em seus territórios, como a questão da invasão do garimpo.
Ela sugeriu que as lideranças indígenas solicitem uma visita do Mecanismo de Peritos em Direitos Indígenas do Conselho de Direitos Humanos da ONU ao Brasil. Desta forma, o Mecanismo pode elaborar um estudo detalhado sobre as violações dos direitos dos povos indígenas no país e cobrar respostas do governo.
Convidada, a Missão Permanente do Brasil junto à ONU não compareceu ao evento paralelo da aliança. “Foi uma pena que os representantes do Itamaraty em Genebra não tenham comparecido ao evento, embora tenham sido convidados. Encontraremos outras formas de levar essas recomendações ao governo brasileiro, e vamos insistir na importância do diálogo com a sociedade civil”, comentou Luis Donisete Grupioni.
* Luis Donisete Grupioni e Marina Vieira
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Lideranças indígenas denunciam garimpo ilegal em Genebra
Representantes de aliança dos povos Kayapó, Yanomami e Munduruku irão falar na 17ª sessão do Mecanismo de Especialistas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (EMRIP)
Doto Takak Ire, liderança Kayapó da Terra Indígena Menkragnoti e presidente do Instituto Kabu e Júlio Ye’kwana, presidente da Associação Wanasseduume Ye'kwana (SEDUUME), da Terra Indígena Yanomami, irão discursar na plenária principal nas manhãs dos dias 8 e 9 de julho, durante as discussões dos Itens 3 e 5 da programação, respectivamente.
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Doto Takak Ire, liderança da Terra Indígena Menkragnoti|Fred Mauro/Terra Floresta Filmes/ISA
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Julio Ye'kwana, liderança da Terra Indígena Yanomami|Adriana Duarte/ISA
No dia 10 de julho, às 15h local, acontece o evento paralelo “Povos Indígenas contra o garimpo de ouro na Amazônia brasileira”, organizado pela Aliança em Defesa dos Territórios e a Rede de Cooperação Amazônica (RCA), com apoio do Instituto Socioambiental (ISA), Greenpeace, Instituto Iepé, Rainforest Foundation Norway e Instituto Raça e Igualdade.
A abertura será feita por Todd Howland, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) e contará com a participação das lideranças Kayapó e Ye’kwana, de Manoela Pessoa De Miranda, do Secretariado da Convenção de Minamata e de Anexa Alfred Cunningham, do EMRIP.
Em 2023, a exploração ilegal de ouro em Terras Indígenas na Amazônia brasileira resultou no desmatamento diário de uma área equivalente a quatro campos de futebol. Nas terras dos povos Kayapó, Munduruku e Yanomami se concentram 95% dos garimpos ilegais, totalizando 26,7 mil hectares destruídos até meados de 2024.
Suíça e Canadá são os principais importadores de ouro do Brasil. Em 2022, lideranças indígenas pediram que refinarias suíças se comprometessem a não comprar ouro de Terras Indígenas, porém, a falta de mecanismos de rastreamento eficientes prejudicam a fiscalização.
Apesar da mudança de governo no Brasil, a conjuntura política ainda é desfavorável devido ao avanço de pautas anti-indígenas no Congresso Nacional. Enquanto isso, a vida e a saúde dos indígenas seguem em risco, afetadas por invasões garimpeiras – muitas vezes ligadas ao narcotráfico e facções criminosas –, que resultam em violência, disseminação de doenças, contaminação dos rios e prejuízo às atividades de subsistência.
Pesquisas em comunidades Yanomami e Munduruku mostram altos índices de contaminação por mercúrio, indicando risco de mal de Minamata – doença neurológica causada pela intoxicação por mercúrio severa. Em 2023, foi decretada crise sanitária na TI Yanomami, mas os casos de malária e desnutrição infantil continuam alarmantes, exigindo ações estruturantes para a saúde indígena.
Recomendações ao governo brasileiro
Em Genebra, as lideranças Kayapó e Ye’kwana irão solicitar que os Relatores Especiais e outros Procedimentos Especiais da ONU se comprometam com a defesa dos direitos dos povos indígenas e façam recomendações ao governo brasileiro.
Concluir em caráter emergencial a desintrusão da TI Yanomami e implementar a desintrusão das TIs Munduruku e Kayapó;
Apresentar planos de proteção territorial permanentes para todos os territórios, que incluam: (i) implementação e/ou recuperação de bases de proteção territorial; (ii) controle efetivo do espaço aéreo; (iii) monitoramento remoto regular do desmatamento dentro das Terras Indígenas, com resposta rápida dos órgãos de comando e controle diante de novos alertas; (iv) formação de agentes indígenas para contribuir com a proteção territorial; (v) promoção de patrulhas regulares nas zonas sob pressão; (vi) garantia da segurança das lideranças e organizações indígenas ameaçadas por garimpeiros.
Garantir a expansão das pesquisas sobre contaminação mercurial nas pessoas e nos peixes que consumimos; a célere elaboração de um plano de acompanhamento e tratamento das pessoas contaminadas; e de um plano de descontaminação dos rios;
Desenvolver e implementar mecanismos para aprimorar a transparência e o controle da cadeia produtiva do ouro, tanto dentro do território nacional quanto nos destinos das exportações;
Controlar a comercialização ilegal do mercúrio, sobretudo nas fronteiras do país;
Controlar a comercialização de máquinas utilizadas no garimpo, como retroescavadeiras, e exigir que os fabricantes rastreiem o seu uso;
Concluir a demarcação da TI Sawre Muybu, do Povo Munduruku. Todos os processos de demarcação no Brasil foram severamente impactados pela Lei 14.701/2023. É urgente que o Supremo Tribunal Federal julgue a inconstitucionalidade desta lei; e
Garantir que não haja mineração em Terras Indígenas no Brasil, nem qualquer outro tipo de exploração que afete a salvaguarda dos biomas que nós povos indígenas sempre fizemos. Não queremos substituir o garimpo pela mineração, mas sim o garimpo pela floresta saudável.
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O Xingu é um só
Na Reserva Extrativista Rio Iriri, Terra do Meio, Pará, a diversidade que forma a Rede Xingu+ se uniu para fortalecer laços e reafirmar a defesa de direitos e territórios frente às ameaças na bacia
Do norte ao sul do Xingu, indígenas e ribeirinhos se reuniram na Resex Rio Iriri para a 6ª Assembleia da Rede Xingu+|Kamikia Kisedje/ISA
Durante quatro dias, o centro do Xingu foi a Reserva Extrativista Rio Iriri, Terra do Meio, no Pará. A comunidade São Francisco recebeu de braços abertos – e com muito peixe assado, castanha e açaí – toda a diversidade e a potência dos conhecimentos e lutas de povos da Bacia do Rio Xingu.
O Corredor de Sociobiodiversidade do Xingu compreende uma área de 26,7 milhões de hectares, distribuída entre os biomas Amazônia e Cerrado, e que sofre com os impactos do desmatamento, grilagem, agrotóxicos, garimpo, roubo de madeira e megaprojetos de infraestrutura.
Ele é formado por Terras Indígenas e Unidades de Conservação contíguas, onde vivem cerca de 25 mil pessoas de 27 povos indígenas e comunidades ribeirinhas. Na 6ª Assembleia da Rede Xingu+, a confluência de povos que percorreram milhares de quilômetros por rios, estradas e ar, afirmou que o Xingu é um só na defesa de seus territórios, culturas e direitos.
A grande rede que se formou no coração do Beiradão começou a ser tecida dias antes, a partir dos Territórios Indígena do Xingu (TIX), Kayapó, Panará, Xikrin e tantas outras localidades no Corredor de Sociodiversidade do Xingu, saindo dos municípios de Querência, Canarana, Tucumã, Novo Progresso, Peixoto de Azevedo e Altamira rumo à Resex Rio Iriri.
Para Anaya Suya, conselheira da Rede Xingu+ e assessora de comunicação da Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), o encontro destacou a importância de fortalecer a articulação e criar musculatura para enfrentar os desafios de uma bacia que está no meio do furacão. “É crucial buscar alternativas para fortalecer a proteção e implementar os planos de gestão. As Terras Indígenas e de Comunidades Tradicionais do Xingu são um exemplo contundente de como o Xingu está segurando o desmatamento e assegurando os serviços ambientais estratégicos para todos."
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Povo Xipaya, da Volta Grande do Xingu, se apresenta na abertura da 6ª Assembleia da Rede Xingu+, na Resex Iriri|Kamikia Kisedje/ISA
Alguns levaram três dias em ônibus e carros, outros navegaram por longas horas. E a cada sorriso e abraço, a 6ª Assembleia da Rede Xingu+ se multiplicou e expandiu, até conectar 53 organizações indígenas e ribeirinhas – 21 recém-integradas – e cerca de 350 defensores e defensoras do Xingu – pela primeira vez em território beiradeiro.
Consolidada em 2019, devido ao avanço das ameaças e pressões ao Xingu com a chegada do governo de Jair Bolsonaro, a Rede Xingu+ demonstrou nos últimos anos que sua estratégia de atuação é fundamental para a proteção do Xingu.
"A rede não funciona para competir com as associações, mas para fortalecê-las. É como uma flecha pra fazer a mensagem de vocês chegar onde precisa. Somos a força unida de muitos e muitas para combater as ameaças nos territórios e defender direitos", afirmou na abertura do encontro André Villas-Bôas, da secretaria executiva da Rede Xingu+.
As Áreas Protegidas que formam o Corredor – nove Unidades de Conservação e 22 Terras Indígenas –, são essenciais para barrar a destruição das florestas e dos territórios. Segundo dados do Sirad X – monitoramento do desmatamento feito pela Rede Xingu+ –, entre 2019 e 2022, período do governo Bolsonaro, mais de 200 árvores foram derrubadas por minuto.
Os relatos dos territórios confirmam as análises extraídas das imagens de satélites. “O governo Bolsonaro abriu as portas para a invasão das Terras Indígenas. Há muito roubo de madeira no TIX. Apesar da diminuição do desmatamento, continuamos a lutar pela nossa terra”, avisou o cacique Tapi Yawalapiti, do Instituto Aritana, durante painel sobre proteção territorial.
Da esquerda à direita, Kreton Panará, Txypyry Metuktire e Kirisawa Xipaya compartilham histórias da jornada até a Resex Iriri|Kamikia Kisedje/ISA
O cacique Managu Ikpeng, também do TIX, reforçou a preocupação com a atividade ilegal e pontuou que providências ainda não foram tomadas para a expulsão definitiva dos invasores. “Há cinco anos que esse problema está acontecendo. Não é falta de falar. Falamos com várias autoridades, mas nada aconteceu”, lamentou.
“Estamos lutando para que os brancos não tomem a nossa terra. Não queremos mais desmatamento. Estamos sob muito risco. Queremos pedir aos parceiros para fazer o monitoramento no nosso território”, pediu Motjibi Arara, liderança da Terra Indígena Arara.
Entre as Terras Indígenas mais desmatadas no Brasil no período do governo Bolsonaro, seis estão na Bacia do Xingu, sendo a TI Apyterewa a que foi mais afetada, explicou Thaise Rodrigues, analista de geoprocessamento do Instituto Socioambiental (ISA).
Segundo ela, as Unidades de Conservação também sofreram inúmeras violações, incluindo a abertura de uma estrada que quase cortou o corredor ao meio.
De acordo com as últimas medições do Sirad-X, a devastação desacelerou no último ano. No entanto, o Xingu segue sob pressão. “O que aconteceu de 2023 até hoje? Houve uma mudança de governo. O desmatamento caiu mais da metade na Bacia do Xingu, 55%. Dentro das Áreas Protegidas, a redução foi ainda maior: 77%. Foi iniciado o processo de desintrusão das TIs Apyterewa e Trincheira Bacajá. Mas os desafios permanecem imensos”, salientou.
Outro elemento fundamental para os recordes de devastação em Áreas Protegidas do Xingu, como a TI Apyterewa, são os impactos de megaprojetos de infraestrutura na região, sobretudo a construção da Hidrelétrica de Belo Monte. Combinados com a passagem da “boiada”, incentivada pelo governo anterior, tornaram o Xingu um dos epicentros da destruição socioambiental no país.
“No passado, várias obras [no Xingu] foram feitas sem respeitar direito algum. O governo não consultava as comunidades. A ideia da Rede Xingu+ é que isso não continue mais acontecendo. Os povos têm que ser ouvidos e participar [das consultas] para pensar como os impactos podem ser reduzidos”, defendeu John Razen, advogado do ISA.
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Associações beiradeiras, indígenas e parceiros somaram forças durante a 6ª Assembleia da Rede Xingu+|Kamikia Kisedje/ISA
Parte dos povos que constituem a Rede Xingu+ tem protocolos de consulta – um dos mecanismos utilizados por povos indígenas e populações tradicionais para exigir seu direito à consulta prévia, livre e informada em todas as etapas de projetos que possam impactar seus territórios.
Ewésh Yawalapiti, consultor jurídico da ATIX, trouxe para o debate a experiência da advocacia indígena no enfrentamento aos desafios que as megaobras de infraestrutura impõem aos territórios.
Especialista em direito à consulta, ele contou que conduz atualmente um processo de consulta unificada sobre a BR-242 e a Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO). O trecho da BR-242 entre Paranatinga (MT) e Querência (MT) havia sido inicialmente projetado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) para passar sobre as paisagens de Kamukuwaká e Sagihengu – sítios sagrados dos povos do Alto Xingu.
“Estamos levando a experiência para que se aplique à Ferrogrão também. A Ferrogrão é muito maior e [atinge] vários territórios, então é mais complicado, mas mesmo assim é uma experiência importante e temos que exigir do governo que [o processo de consulta] seja cumprido”, reforçou o advogado.
"Estamos enfrentando esse problema também. Se a Ferrogrão for construída, causará muitos problemas, não só para nós, mas também para nossos parentes do Tapajós e os Panará. Os povos indígenas precisam ser consultados”, exigiu Karany Metuktire, neto do Cacique Raoni Metuktire.
“Mesmo sem protocolo, todos devem ser ouvidos em qualquer decisão que afete suas vidas e territórios. Belo Monte está construída, mas não é um fato consumado”, lembrou Thais Mantovanelli, antropóloga do ISA que acompanha os impactos da hidrelétrica, inaugurada em 2016 na região da Volta Grande do Xingu.
“O roubo de 70% das águas do [Rio] Xingu continua impune, e as condicionantes de mitigação não estão sendo cumpridas”, continuou. Desde o barramento, em 2015, os povos impactados pela usina travam uma disputa pela água com a Norte Energia. O desvio imposto pela concessionária é chamado de Hidrograma de Consenso, “mas de consenso não tem nada”, como afirma a animação “Pulsa, Xingu”, lançada em 2023.
“Estamos lutando pela nossa sobrevivência. Hoje não pescamos mais para vender, apenas para se alimentar. Nosso modo de vida mudou totalmente”, denunciou o Cacique Giliarde Juruna (Yudjá), da aldeia Mïratu, TI Paquiçamba.
Ao final da assembleia, o território ancestral do povo Juruna/Yudjá foi o escolhido para sediar o próximo encontro da Rede Xingu+, que acontece a cada dois anos. Giliarde Juruna avisou que os visitantes vão poder ver de perto a catástrofe socioambiental provocada por Belo Monte na Volta Grande do Xingu.
Comunicadores da Rede Xingu+
Em entrevista aos comunicadores do Xingu+, a ribeirinha Sara Lima, da Volta Grande do Xingu, afirmou que o mais importante é que o Rio Xingu viva. “A proteção da Bacia do Xingu é fundamental para que os peixes possam se reproduzir. Assim, os meus filhos e netos continuarão existindo. O Xingu é um pai e uma mãe, eu como o peixe que vem do rio e se o peixe está doente eu também vou ficar doente, assim como os nossos parentes indígenas, pois a Bacia do Xingu é uma só. É fundamental proteger o Xingu, pois nós somos o Xingu”.
Esse e outros relatos poderão ser conferidos em breve na produção audiovisual O Xingu é um só, que contou com a direção dos comunicadores do Xingu+ e edição de Arewana Juruna. Ao longo dos dias da assembleia, os comunicadores estiveram à frente da divulgação do encontro, no Instagram.
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Comunicadores do Xingu+ estiveram à frente da cobertura da 6ª Assembleia da Rede Xingu+, na Resex Rio Iriri, no Pará|Yaa Yudjá/ISA
Foi a primeira vez que o comunicador Takàk-môrô Kayapó, um dos representantes do Instituto Kabu na Rede Xingu+, esteve em uma assembleia tão grande. “E lá eu não me reconheci, pois sou muito tímido, mas de repente todos estavam falando comigo e eu me sentindo à vontade para falar com todos e fazer fotos. Depois, recebi mensagens da minha própria aldeia elogiando as fotos que tirei”.
Já para o comunicador Kamatxi Ikpeng, que está há cinco anos na Rede Xingu+, o ponto de destaque foi a decisão de que os indígenas e beiradeiros estariam pela primeira vez à frente da cobertura. “Isso me deixou feliz, pois tivemos a oportunidade de mostrar o nosso trabalho e o nosso potencial.”
Mostrar a importância dos povos que seguram o céu e dependem da visibilidade dos seus modos de vida, foi o que moveu a criatividade do comunicador Joelmir Silva, da Comunidade Maribel - TI Cachoeira Seca - Pará, na elaboração do roteiro.
Assista ao vídeo dos comunicadores:
“Queremos mostrar para o mundo qual é a relação que a gente tem com a floresta e com o Xingu. O trabalho dos comunicadores do Xingu+ reflete muito sobre isso. Antes, as comunidades se perguntavam sobre o que é comunicação. Agora, mostramos para todos qual é o papel da comunicação para dentro do território e para fora também”.
Durante a assembleia, os comunicadores xinguanos compartilharam que iriam expor 20 imagens em Oslo, capital da Noruega, entre 3 e 17 de junho. A mostra reuniu fotografias de oito comunicadores indígenas e ribeirinhos da Rede Xingu+ e contou com a curadoria de Kujaesãge Kaiabi.
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Sessão de retratos organizada pelos comunicadores do Xingu+, refletindo sobre o uso da comunicação para a proteção da floresta, durante a 6ª Assembleia da Rede Xingu+|Samantha Khisetje/ISA 2024
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Comunicador Kamatxi Ikpeng em frente às fotografias que apresentou na exposição Os Olhos do Xingu, em Oslo. Ao centro, registro de um incêndio devastador no Território Indígena do Xingu|Silia Moan/ISA 2024
“Contar com a presença de Anne Lindboe, prefeita de Oslo e do Tørris Jæger Secretário Executivo da Rainforest na abertura da exposição foi muito emocionante”, relatou Kamatxi Ikpeng.
A jornada do comunicador Ikpeng na Noruega também foi marcada pelo encontro com jovens políticos de seis partidos noruegueses, no Museu Nobel da Paz. “Falei sobre as dificuldades para proteger nossos modos de vida e os riscos à nossa soberania alimentar devido à crise climática”, contou.
Calor fora de época
Defender o Xingu é defender a floresta e seus povos, e também o futuro do planeta. Suas áreas preservadas em Terras Indígenas e Unidades de Conservação são imensos reservatórios de CO2 – fundamentais para o combate da crise climática.
No entanto, justamente aqueles que mais contribuem para a proteção das florestas – povos indígenas e populações tradicionais – estão entre os mais afetados pelos impactos do aquecimento global.
É a realidade vivida pelos ribeirinhos da comunidade São Francisco, conforme conta Assis Porto de Oliveira, o Seu Assis, presidente da Rede Terra do Meio e membro do conselho político da Rede Xingu+. “Vocês estão aqui sentindo esse calor à noite, mas não era assim antes. Nessa época – maio, junho – fazia frio nesse horário. Agora tudo mudou”.
De fato, durante os dias de encontro, o intenso calor sentido nas manhãs e tardes dava pouca trégua quando o sol se punha. E o banho de rio frequentemente acontecia em águas quentes – uma triste consequência das mudanças climáticas no modo de vida dos ribeirinhos.
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Francisco de Assis Porto de Oliveira, presidente da Rede Terra do Meio e Marines Lopes de Souza, vice-conselheira da Rede Xingu+|Tairu Kayabi Juruna/ISA
Segundo Maria Laura Mendes da Silva, a Dona Laura, moradora da comunidade São Francisco, a seca intensa que atingiu a região no ano passado provocou a proliferação de insetos. “As mulheres ficavam com coceira depois de banhar. A gente coava a água, mas ela era muito feia, não adiantava”, relatou.
Um dos painéis da assembleia se debruçou sobre o tema climático, com foco nas discussões de mercado de carbono. No Xingu, é cada vez maior o assédio de empresas interessadas em firmar contratos de compra de créditos de carbono – o que torna urgente o diálogo sobre os riscos em torno da atividade.
A Rede Xingu+ apresentou aos participantes a série de vídeos “Carbono: o que você precisa saber”, que traz informações para que povos indígenas e Comunidades Tradicionais entendam o que são e quais os cuidados a serem tomados em relação a projetos de carbono e de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (Redd+) em seus territórios.
Foram debatidos aspectos relacionados aos projetos locais de carbono e também aos sistemas jurisdicionais que vêm sendo desenvolvidos pelos estados amazônicos.
Em breve, saiba como foram essas discussões no boletim de áudio Vozes do Clima! Escute o primeiro episódio
Florestas em pé e rios limpos
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Um dos afluentes do Rio Xingu é o Iriri, que recebeu a 6ª Assembleia do Xingu+. O Corredor de Sociobiodiversidade do Xingu compreende uma área de 26,7 milhões de hectares, distribuída entre os biomas Amazônia e Cerrado. É o abrigo de cerca de 25 mil pessoas de 27 povos indígenas e comunidades ribeirinhas|Kamikia Kisedje/ISA
Ao final do último dia de encontro, aconteceram as eleições para o Conselho Político e a Secretaria Executiva da Rede Xingu+, que será exercida pelo ISA por mais dois anos. Foram integradas mais duas cadeiras ao Conselho Político da Rede, totalizando agora nove titulares e nove suplentes.
Ewésh Yawalapiti, conselheiro reeleito pelo TIX, leu a carta-manifesto da Assembleia – elaborada a partir das discussões e denúncias apresentadas durante os dias anteriores. “Aquilo que sempre promovemos e desejamos, torna-se cada vez mais urgente: florestas em pé e rios limpos. Enchentes, secas, incêndios florestais e outros desastres climáticos afetam a vida das pessoas, seja na floresta ou nas cidades”, alerta o documento.
Um dos encaminhamentos é avançar junto ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), que estiveram presentes na assembleia, com a proposta de reconhecimento do Corredor de Sociobiodiversidade do Xingu como um Mosaico de Áreas Protegidas, o que, na visão da Rede Xingu+, pode facilitar a implementação de políticas públicas e ampliar espaços de diálogo com órgãos governamentais e parceiros.
A aliança de organizações também comemorou a proposta do Fundo Xingu, como uma forma de fortalecer as organizações da Rede Xingu+ e garantir recursos para implementar os PGTAs e Planos de Manejo nas Áreas Protegidas do corredor. “Seguiremos debatendo e formatando essa ideia, detalhando possíveis modelos de gestão e governança do Fundo, suas regras e objetivos”, diz a carta.
Aplausos e celebração. Chegou a hora de encerrar os trabalhos e se preparar para a despedida. Os comunicadores da Rede Xingu+ convocam os participantes para a foto final.
Lado a lado, iluminados pelo sol quente do fim de tarde, os defensores e defensoras das florestas formaram com seus corpos a palavra “Xingu+”, eternizando na imagem e no coração o que dá sentido e move as centenas de povos e comunidades que constituem a rede.
Na luta pela vida, o Xingu vai ser sempre um só.
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Com a produção dos comunicadores Joelmir Silva, Iosi Panará e Yaa Yudjá, participantes da 6ª Assembleia mostraram que são o Xingu|Arewana Juruna/ISA
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As principais informações sobre o ISA, seus parceiros e a luta por direitos socioambientais ACESSE TODAS
Restauração ecológica em foco: 3º Encontro do Redário acontece em Juazeiro (BA)
De 4 e 7 de julho, são esperados cerca de 150 participantes entre coletores, técnicos e pesquisadores
Foto tirada durante o II Encontro do Redário, que aconteceu na Aldeia Multiétnica em Alto Paraíso (GO), em julho de 2023 | Luana Santa Brígida
Entre 4 e 7 de julho, Juazeiro (BA) será a sede do 3º Encontro do Redário – articulação de redes e grupos de coletores de sementes nativas – que deve reunir 150 participantes, incluindo coletores, técnicos e pesquisadores da restauração ecológica. Além disso, a cidade também será palco da V Conferência Brasileira de Restauração Ecológica (SOBRE 2024) entre 8 e 12 de julho.
Cerca de 70 coletores representantes de 24 redes já articuladas e de outras 10 em processo de articulação - sendo cinco do semi-árido, técnicos e entidades parceiras – devem comparecer ao evento.
Conheça as redes que compõem o Redário atualmente aqui.
A programação do dia 5 está voltada para validação de processos internos e estreitamento dos laços entre as redes. Já as atividades do dia 6 acontecem no Centro de Formação D. José Rodrigues, do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada – IRPAA, parceiro na realização do 3º Encontro do Redário.
Lá, cerca 50 convidados da SOBRE 2024 se juntarão aos 98 coletores e técnicos do Redário, em visitação a áreas de restauração do bioma Caatinga e tecnologias sociais do semi-árido. O objetivo é promover a troca de experiências entre coletores e restauradores de diversos biomas e a ampliação das conexões com o mercado da restauração.
No final da tarde, será plantada uma muvuca (mistura) com sementes em área que será monitorada pelo IRPAA. Na noite do dia 6, haverá a tradicional feira de trocas de sementes. O encerramento do 3º Encontro acontece na manhã do dia 7.
Na manhã do dia 8, tem início a V Conferência Brasileira de Restauração Ecológica (SOBRE 2024). O Redário é tema de 18 submissões aprovadas. Coletores e técnicos tomarão parte nas apresentações. Confira mais informações sobre V Conferência Brasileira de Restauração Ecológica aqui.
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As principais informações sobre o ISA, seus parceiros e a luta por direitos socioambientais ACESSE TODAS
Comunicadores da Rede Xingu+ abrem mostra fotográfica no centro de Oslo, capital da Noruega
Com curadoria de Kujaesãge Kaiabi, ‘Os Olhos do Xingu’ convida o público a conhecer, até 17 de junho, as belezas e as ameaças aos modos de vida nos territórios
Dança coletiva do povo Khïsêtjê durante tradicional festa de fim de ano na aldeia Khikatxi, Terra Indígena Wawi|Kokoyamaratxi Renan Suya
A exposição Os olhos do Xingu, que acontece entre os dias 3 e 17 de junho no centro de Oslo, capital da Noruega, reúne fotografias de oito comunicadores da Rede de Comunicadores Xingu+ que vivem em Terras Indígenas na Bacia do Rio Xingu, entre Pará e Mato Grosso.
Com curadoria de Kujaesãge Kaiabi e dos comunicadores indígenas, a exposição é uma realização da Rede Xingu+, da Rainforest Foundation Norway e do Instituto Socioambiental (ISA). As fotografias serão exibidas em painéis em grande formato na Kronprinsesse Märthas plass, ao lado do Centro Nobel da Paz e da prefeitura de Oslo.
Ao todo, são 20 imagens que apresentam a preocupação dos comunicadores indígenas e ribeirinhos com pressões e ameaças à Bacia do Rio Xingu, bem como a felicidade expressa no relacionamento com as comunidades, seus conhecimentos e culturas. A exposição direciona o olhar da sociedade envolvente para além da fronteira do imaginário popular, destacando a relação intrínseca entre o bem viver e a proteção dos territórios.
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Jepi Kaiulu Kalapalo brinca alegremente com borboletas em frente à sua casa na Aldeia Kalapalo, Terra Indígena do Xingu|Tauana Kalapalo/2016
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Na Aldeia Kalapalo, crianças se divertem com o ‘ta’, brincadeira que consiste em acertar uma flecha no centro de uma roda em movimento|Tauana Kalapalo/2017
As imagens produzidas pelos comunicadores ainda propõem uma reflexão sobre como os diferentes modos de produção de registros visuais incentivam as novas gerações de comunicadores a fazer fotografia a partir do pensamento dos povos do Xingu.
A seleção de fotos apresentadas na mostra inclui registros de mobilizações em Brasília, como a 3ª Marcha Mulheres Indígenas, realizada em setembro de 2023, além de retratos feitos em reuniões e em danças e festividades realizadas nos territórios.
Em uma potente fotografia monocromática, a comunicadora Tina Yawalapiti retratou o centro cultural Umatalhi, importante espaço para o fortalecimento do modo de vida alto xinguano pela realização de atividades como o ensino da língua yawalapiti – atualmente com poucos falantes –, aulas de artesanato e cursos de formação para comunicadores.
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Construção de Umatalhi, centro cultural na aldeia Tuatuari, no Alto Xingu|Tina Yawalapiti/ISA
Sobre a curadora, Kujaesãge Kaiabi
A comunicadora vive na aldeia Guarujá, no Território Indígena Xingu (TIX), onde se destaca como uma das mais promissoras figuras femininas do audiovisual. Todos os dias acorda cedo, toma banho no rio e prepara a alimentação da sua família. Junto com as mulheres de sua comunidade, coleta mandioca, amendoim, torra farinha, faz artesanato e cuida de sua aldeia.
Seu principal papel enquanto comunicadora é apoiar os caciques e lideranças kaiabi a compreender os retrocessos governamentais e ameaças que tramitam no Congresso Nacional. “Sou uma porta-voz do povo Kaiabi”, conta a comunicadora. Para isso produz vídeos e áudios informativos.
O desejo de se tornar comunicadora surgiu quando foi convidada para atuar no filme A história da Cutia e do Macaco, do Instituto Caititu. Desde então, Kujaesãge passou a se inspirar nas produções que viu durante a sua atuação. “Para mim não foi fácil, pois naquela época não havia mulheres na área audiovisual”, relatou.
A imagem tem um poder muito significativo para o povo Kaiabi: “quando tiramos uma foto ou fazemos um vídeo, é esse registro que servirá como dicionário ou lembrança da família que se foi”, disse a comunicadora, que também pesquisa imagens do seu povo em arquivos históricos de conteúdos produzidos também por cineastas não-indígenas.
Desde 2018, realiza a cobertura audiovisual da Mobilização das Lideranças Indígenas, no Acampamento Terra Livre em Brasília.
Em 2022, foi curadora do 1º Festival de Cinema e Cultura Indígena do Brasil e no mesmo ano expôs no Instituto Moreiras Salles, fotos e um filme em que apresenta a trajetória do seu avô, Prepori Kaiabi, um dos principais pajés da história do Parque Indígena do Xingu (PIX).
Atualmente, Kujaesãge Kaibi (@kujaesage) se dedica a produção de um longa-metragem que conta a história de Prepori Kaiabi.
Sobre os comunicadores da Rede Xingu+
Composta por 26 membros, a Rede de Comunicadores Indígenas e Ribeirinhos do Xingu integra a Rede Xingu+, uma articulação entre organizações de povos indígenas, associações de comunidades tradicionais e instituições da sociedade civil atuantes na bacia do Rio Xingu.
Ao se apropriarem do uso de equipamentos e tecnologias sociais, os comunicadores da Rede Xingu+ assumem o protagonismo na comunicação interna e articulação política entre diferentes povos da Bacia do Rio Xingu, e contribuem para a prevenção, emissão de alertas e monitoramento de atividades ilegais nas Áreas Protegidas do Xingu.
Tiogo Kalapalo (no centro) distribuindo peixes para os moradores da Aldeia Aiha Kalapalo, na Terra Indígena do Xingu, como parte do processo de agradecimento do dono do ritual Kuarup à pela contribuição da comunidade, que juntou polvilho para alimentar os participantes do evento|Tauana Kalapalo/2022
Banco de areia no Rio Xingu, em região próxima à Aldeia Samaúma, do povo Kawaiwete, está cada vez maior, fenômeno agravado pelas mudanças climáticas|Kamatxi Ikpeng/2023
Fim de tarde na Esec Terra do Meio. Ao atingir a posição registrada na foto, o sol sinaliza para os beiradeiros que chegou ao fim o dia de trabalho e começará um horário considerado sagrado para o descanso|Joelmir Silva e Silva/2023
Mulheres Xinkrin e Kayapó participam de apresentação tradicional de canto e dança antes do início de uma partida de futebol pela 3ª Copa Mebêngôkre Nire de Futebol Society|Kubenkákre Kayapó/2023
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Campanha busca doações para Tuire Kayapó, que luta contra o câncer
Liderança da Terra Indígena Las Casa (PA), Tuire esteve à frente da luta contra a construção de hidrelétricas no Xingu
Tuire Kayapó durante a Pré-Marcha das Mulheres Indígenas, em fevereiro de 2023. Todo ano a liderança percorre mais de 1.110 quilômetros até Brasília, para participar das mobilizações e lutar pela floresta em pé 📷 Benjamin Mast/La Mochila Migrante/ISA
Em 1989, Tuire Kayapó, liderança da Terra Indígena Las Casas (PA), esteve à frente da luta contra a construção de hidrelétricas no Xingu, em especial do projeto da Usina Hidrelétrica Kararaô, que mais tarde se tornou a Usina de Belo Monte.
Foi nesse ano que a liderança Kayapó protagonizou o icônico registro em que brada seu facão contra o rosto do então presidente da Eletronorte, José Antônio Muniz Lopes, em um gesto que marcou para sempre a resistência dos povos indígenas.
Hoje, aos 56 anos, a grande guerreira Kayapó luta pela sua vida e enfrenta um câncer no colo do útero, uma doença que representa 7,5% das mortes femininas por cânceres, com estimativa de 311 mil mortes por ano, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Durante toda sua vida Tuire defendeu incansavelmente os direitos da floresta amazônica e de seus povos: “As florestas, os rios, os povos indígenas: é a sobrevivência deles que eu defendo até hoje”, afirmou em entrevista para o #ElasQueLutam.
Para que Tuire Kayapó continue a lutar pelos direitos dos povos da floresta, ela precisa de apoio para enfrentar o câncer.
Kaue Ferreira, do ISA, com a camiseta da Pimenta do Rio Negro|Claudio Tavares/ISA
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Clara de Assis, do ISA, com a camiseta do Babaçu do Xingu|Claudio Tavares/ISA
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Patrícia Ribeiro, da Rede Xingu+, com a camiseta de Muvuca de Sementes|Claudio Tavares/ISA
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Veronice Cardoso, do ISA, com a camiseta da Roça Quilombola|Claudio Tavares/ISA
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma”, lançadas pelo Instituto Socioambiental (ISA) como parte da celebração dos 30 anos da organização, apresenta exemplos da biodiversidade que são fruto dos saberes e modos de vida de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. As ilustrações são de Catarina Bessell.
Estudo publicado pelo ISA mostrou que esses povos e suas economias são responsáveis, juntos, pela proteção de um terço das florestas no Brasil. O impacto positivo é fundamental para nossos tempos: mitigar os efeitos da emergência climática.
Dar visibilidade aos conhecimentos e culturas dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais fortalece seus modos de vida e sua conexão com os territórios.
Essas culturas são patrimônios vivos da cultura brasileira e a relação com a natureza garantiu, continua garantindo e vai garantir a conservação de florestas, rios, mares e os diferentes biomas do país.
Com isso, as associações se fortalecem nos processos de organização e comercialização dos produtos, e se tornam agentes de articulação de suas culturas e da defesa de seus direitos.
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Patrícia Ribeiro, da Rede Xingu+, com a camiseta do Pequi do Xingu|Claudio Tavares/ISA
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Kaue Ferreira, do ISA, com a camiseta da Roça Quilombola|Claudio Tavares/ISA
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Francisco de Sousa, do ISA, com a camiseta do Babaçu do Xingu|Claudio Tavares/ISA
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Clara de Assis, do ISA, com a camiseta da Pimenta do Rio Negro|Claudio Tavares/ISA
Para quem compra, cada camiseta traz os saberes de povos e comunidades, bem como suas lutas e resistência para manter suas culturas e territórios, fundamentais para a regulação do clima.
Com as economias da sociobiodiversidade, o futuro pode ser outro. Vista essa camisa!
Camiseta Pequi do Xingu
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma” apresenta o Pequi do Xingu, fruto que simboliza a economia do cuidado com as florestas do povo Kisêdjê, em Mato Grosso. A iniciativa de produção de óleo a partir do pequi do Xingu recebeu o Prêmio Equatorial, da ONU, em 2019.
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma” apresenta a Muvuca de Sementes, técnica que mistura saberes e sementes para o processo de restauração florestal. As sementes são coletadas por povos e comunidades tradicionais para, em seguida, serem semeadas em áreas degradadas e beiras de rio e gerar as florestas do futuro.
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma” apresenta o Babaçu do Xingu, fruto que movimenta as organizações indígenas e ribeirinhas da região da Terra do Meio, em Altamira, no Pará. A farinha do coco babaçu, produzida a partir de sua entrecasca, é rica em nutrientes e tem começado a fazer parte da merenda escolar na região.
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma” apresenta a Roça Quilombola, parte do Sistema Agrícola Tradicional Quilombola, reconhecido pelo Iphan como patrimônio cultural imaterial do Brasil. A roça quilombola é símbolo da diversidade agrícola das comunidades quilombolas do Vale do Ribeira, no sudeste de São Paulo, retratada no filme “Do Quilombo pra Favela - Alimento para a resistência negra”.
A série de camisetas “Alimento para corpo e alma” apresenta as Pimentas do Rio Negro, um dos símbolos da diversidade agrícola dos povos indígenas da região, no noroeste do Amazonas. São ao menos 78 variedades de pimentas, que desidratadas e piladas com sal produzem a jiquitaia.
Clara de Assis Andrade, assessora da secretaria executiva do ISA Francisco Cleunilton Moreira de Souza, técnico em administração da loja Floresta no Centro, do ISA Kauê Fillip Ferreira Silva, assistente administrativo do ISA Patrícia Ribeiro Castanha, assistente administrativa da Rede Xingu+ Veronice Cardoso Matos, assistente administrativa da loja Floresta no Centro, do ISA
Fotografia: Claudio Tavares, documentalista do ISA
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